quarta-feira, 30 de junho de 2010

Janela Ensolarada - Ana Paula Lisboa

Chave é elemento decisivo.
Quem me abre quando estou fechada,
Quem fecha minha boca
Quando falo demais.

E, se com Lídia não estais de mãos enlaçadas,
Enlace as suas mãos comigo.
Enlacemos as mãos?

Se me esqueço de tudo,
Se me jogo na cama de banho tomado,
Se tranco todas as portas do quarto,
Eu ainda posso pular uma janela.

Aquela nossa janela ensolarada que pisca todos os dias.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Meu eu - APL

Desculpe.
Me perdoe.
Reconsidere, por favor.
Eu prometo que isso não acontecerá novamente.
A partir de agora permanecerei calada.
Eu não o incomodarei mais com as
Minhas dores de cabeça e o meu mau humor.
As caretas serão substituídas
Por um sorriso largo e falso.
O sono e o tédio se transformarão em
Energia contagiante.
Nada de testa franzida,
Nada de olheiras.
Eu sei fingir direitinho...
E afinal, quem quer o meu eu?

segunda-feira, 28 de junho de 2010

O meu mal - Ana Paula Lisboa

Permanecerei tranqüila e serena.
Sem nada para falar e nem para ouvir.
Somente o silencio do meu estômago
Roncando alto.
Feroz como eu,
Mal humorado e nocivo.

Estarei relaxada durante todo o dia.
Ainda que toda a tecnologia do mundo
Me odeie e que eu queira sair correndo
Cheia de fome e morda alguém pela rua.

“E agora, quem poderá me defender?”
Música doce aos ouvidos,
Conversas gostosas aos dedos,
Paixões melodramáticas ao peito
E açúcar no sangue.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Só para estar vivo - Ana Paula Lisboa

Tudo culpa de uma boca que só
Diz coisas mal ditas.
Foi reclamar do tédio,
Da melancolia
E tudo foi me acontecer
Numa quarta feira
Que nem era de cinzas.
Nem poderia.
Quando o corpo resolve arrepiar, pronto,
Está feito.
Supondo que não haveria mais segredos para contar,
Supondo que eu morreria de fome
Eu supus um beijo.
E agora estou aqui, segredando
Mais uma vez contigo minhas imperfeições.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Úlcera - Ana Paula Lisboa

Da cor do ébano, agradável aos olhos e
Escreve ainda.
Tão completa e complexada.
De versos livres e poucos,
Exacerbadamente prolixos.
Muitas vezes fastidiosos
Mas sempre festeiros.
Em todo o tempo enfatizados pelo não,
Quase sempre pelo talvez e
Jamais pelo sim.
Nunca o sim verdadeiro e verdejante.
Pode-se ouvir, ao longe, um uivo
Melancólico e sublime,
Enfadonho.
Dor de uma úlcera profunda
E quase parnasiana.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Desabafo - APL

E eu aqui, nua, na chuva, escrevendo em prosa.
Eu só estou cansada. Que droga!
Escrever essas coisas me deixa ainda mais irritada, com mais ódio.
Estou cansada de ouvir essa voz chata, irritante, gritante,
Que só fala do que não sabe.
Eu quero uma morte rápida, indolor, que ninguém se importasse,
Num caixão de madeira vagabunda, numa cova rasa, sem flores
E velas.
Minto.
Quero um velório de três dias, com fila na porta.
Quero rios de lagrimas derramadas, e quando a água secar,
Todos verão o sal na calçada.
Quero coroas de flores, quero milhares de velas e
Quero poesias declamadas nas portas.
Eu poderia escrever sobre assuntos relevantes:
Flores, crianças brincando,
Domingos ensolarados, noites estreladas,
Sobre o amor encontrado, o amor impossível,
Sobre a vida na França, um passeio de barco.
Mas não:
Falo de agonia, de dor, de morte matada,
De morte morrida, de choro velado e sobre pneumonia.
Eu não deveria ter me alfabetizado.
Mas vou parar de te incomodar.
Mesmo que doa, mesmo que eu me desmanche,
Mesmo que nada dê certo
E ainda que eu não tenha nem onde dormir.
Ou paro ou morro de vez.
Arranco fora as duas mãos e a língua
E os olhos e as orelhas e os pés.
Faço uma sopa com tudo e vendo na esquina,
Talvez alguém queira me comer.
Talvez.
Talvez eu sirva para alguém.
Talvez.
Talvez eu queira dar para alguém que pague.
Eu posso?
Os meus pés deviam correr,
Mas ficam aqui me olhando com cara de bobo,
Esperando sei lá o quê.
Eu não tenho nada aqui.
Nem pai, nem mãe, nem amigo, nem marido.
Eu me divorciei de todo mundo.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

" A morte é a inventora de Deus"

Pausa. É só notícia. José Saramago morreu hoje... Como eu não saberia escrever nada que pudesse chegar a homenagia-lo (pois ele é - ou era?- tão maior) vou ficar em silencio.
Deixarei que ele fale:

"Nada há que seja verdadeiramente livre nem suficientemente democrático. Não tenhamos ilusões, a internet não veio para salvar o mundo."

"Eu sou um comunista hormonal, meu corpo contém hormônios que fazem crescer minha barba e outros que me tornam um comunista. Mudar, para quê? Eu ficaria envergonhado, eu não quero me tornar outra pessoa."

"Se eu pudesse repetir minha infância, a repetiria exatamente como foi, com a pobreza, com o frio, pouca comida, com as moscas e os porcos, tudo aquilo."

"Não sou pessimista. O mundo é que é péssimo."

"Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara"

"Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos."


No coração, talvez

No coração, talvez, ou diga antes:
Uma ferida rasgada de navalha,
Por onde vai a vida, tão mal gasta.
Na total consciência nos retalha.
O desejar, o querer, o não bastar,
Enganada procura da razão
Que o acaso de sermos justifique,
Eis o que dói, talvez no coração.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Carta Resposta - Ana Paula Lisboa

http://ensaiosdamenteinsana.blogspot.com/2010/06/havana-allyson-alves.html

Rio, 15/06/10.

Caríssimo, não havia melhor momento para receber sua carta. Tenho passado noites geladas por aqui e ler suas palavras aqueceu meu coração, como sempre.
Desculpe a demora da resposta mas não queria escrever de qualquer jeito. Queria parar, pensar em você, lembrar do seu rosto - com e sem barba. Aí demorou para esse tempo acontecer mas finalmente chegou!
Na verdade agora é madrugada (3:27) e eu acabei de sonhar contigo. Sonhei que dançávamos salsa, não consegui mais dormir e vim escrever. Daria tudo para te ver tocando aí e dançando também, eu imagino. Outro dia fui lá naquela Salsa, lembra? Eu me lembro. Noite inebriante aquela...
Que saudades...Nossa 2 anos?! Como diria Luiz Gonzaga, ela amarga como jiló e como não sei cantar pra remediá-la, eu continuo escrevendo pra ver se passa.
As novidades: o livro está no forno e estou ansiosa pra ter esse filho nos braços, está sendo um parto mesmo. Sabrina e Toni se casam em Agosto e você bem que podia vir. Já não basta ter faltado ao MEU casamento?
Hum...quer dizer que os negros (as) daí são bem bonitos... Alguma em especial? Ah, fala logo...conta...conta...
Penso que estamos em cidades trocadas, pois se o frio me mata e o calor te incomoda? Que falta me faz o sol, estou ficando branca! Mas quem sabe eu não vá até você antes do Natal? Preciso mesmo de férias e tu sabe da minha imensa vontade de conhecer Cuba. Quem sabe...?
É lindo ver o tamanho da tua felicidade e saber que tu merece tudo isso. Minha memória está repleta de nós.
Ah, liguei pra sua mãe ontem e marcamos de nos ver no Domingo, almoçar, beber vinho, falar mal de você...essas coisas.
Agora eu vou tentar voltar para o sonho, porque amanhã dou aula bem cedo. Tenho um aluno que me lembra muito você: cabeludo, vive com um violão pra cima e pra baixo e só me faz perguntas intrigantes.
Não deixe de dar notícias...escreva mais...Foi muito bom ouvir sua voz e sentir seu cheiro, quase te tocar.
Beijos ensolarados.

Ana

Ps : Por que Castilho?

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Culpados - Ana Paula Lisboa

Em noites de lua cheia e clara como essa
Eu até chego a sentir falta.
Não é saudade.
Não, é só um cutucão no braço esquerdo,
Na minha memória.

A saudade pode ser do beija-flor,
Da escrita apaixonada,
Do suor em noites geladas,
Da leitura com o coração disparado,
Do meu segredo mais bem guardado
Que contei para todo mundo,
Porém ninguém soube ler.

Mas deixe pra lá, a culpa não é minha,
Não é sua.
A culpa é da lua

Banho - Ana Paula Lisboa

Tome logo esse banho,
Que depois que comes,
Nem mesmo guincho te carrega.

Esfregue essa cara suja pelo tempo e
Que só brilha pelo suor de um dia inteiro.
Lave bem as coxas, cansadas de serem
Espremidas naquela calça barata.

E por favor, não esqueça de lavar
Atrás das orelhas,
Onde o pretume já acumulou

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Eu-Lirico (a) - Ana Paula Lisboa

Agora eu sei que não sou Ela.
Porque a que escreve não é a mesma que fala.
Porque a mão que fala não é a mesma que bate.
Eu não preciso ser Ela,
E é melhor mesmo não ser,
Ainda que assim ninguém nos entenda.
Se eu fosse Ela, não escreveria nada,
Não seria boa em nada.
É melhor ser personagem,
É mesmo bem melhor não ser eu.
Eu a inspiro,
E é por mim que Ela escreve,
Mas ao chegar ao fim da linha
Não é mais de mim que Ela fala.
Nossas brigas diárias,
Nossa pancadaria frenética
E a paz é o pior que podemos ter.
Onde há briga há a alegria.
Quando há briga há poesia.

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