sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Os sentidos – Ana Paula Lisboa

A tradição era a de ouvir.
Ouvir canção de ninar, ouvir historia de Griô e aprender que quando o arroz estala é por que a água já secou. E aprendi assim, sem nem saber como.

A tradição era a de ver.
Ver o pôr do sol na Pedra, de ver passista sambar, de ver a barra da saia rodar. Gosto de ver o tempo passar e me ensinaram a ver o vento quando ele bate no cabelo da moça, e de tanto ver o mundo, aprendi. E aprendi assim, sem nem saber quando.

A tradição era a de cheirar os perfumes da penteadeira da madrinha, de cheirar canela em pau, pitanga no pé, de cheirar a chuva e aprender a dar o carinho mais gostoso do mundo, o cheiro. Descobri que cada coisa no mundo tem seu cheiro gostoso. E aprendi assim, sem nem saber como.

A tradição era a do prazer de estourar plástico bolha, de aprender na pele que lagarta verde queima, mas que as piores são as lagartas pretas, de saber que quando o corpo arrepia pode não ser de frio e perceber que tem gente que quando chega perto, faz minha mão suar. E aprendi assim, sem nem saber como.

A tradição era a de lamber colher de pau que faz brigadeiro, saber que cachaça boa é aquela de desce rasgando, saber que quem beija bem, beija de língua e descobrir mais tarde que amargo, azedo, doce ou salgado é muito pouco pra falar de todos os gostos que provo. E aprendi assim, sem nem saber quando.

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

A Revolução dos seres requer a satisfação da poderosa mulher contemporânea –

Ela não esta nua, não dessa vez, desculpe, fez questão de preservar as peças de roupa. Ao menos uma, a blusa, só por que ele gosta.
Ele dessa vez não vai falar de política, sofrimento ou poderosos homens alemães, só por que ela gosta.
Ali não se ama!
Ele com vontade de sair esgoelando pela rua que não, não ama.
Ela, a Super Mulher Biônica-Invisivel-Telepata que solta raios pelos olhos, fogo pela boca, corpo de aço e punhos de Adamantium. Mas de coração de carne. Não ama.
Ele, de coração despedaçado e pulso aberto sangrando, não, não ama!
Ela, de blusa branca amassada...
Ele, sujeito indefinido do predicado que lhe quer, objeto indireto do meu sujeito lírico.
Não ama, não.
Ela, de leituras subversivas, de pensamentos eróticos, de pouco sonho, de pouca vista.
Ele, que cheira a poeira, que esquece da vida andando na rua até perder de vista.
Não se amam.
Não, não se amam não.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Desmedida - Ana Paula Lisboa

sem chão, sem nexo,
sem lenço
e sem documento,

sem dinheiro, sem pai nem mãe,
sem calor,
sem paixão, sem coração,
sem caixão, sem dor, sem sal, sem céu
nem inferno,

sem sapato, sem espaço,

sem calcinha, sem
celular,
sem aliança, sem amar, sem brinquedo pra brincar, sem computador, sem doce,
sem livro, sem caneta,
sem papel, sem Noel,

sem ouvir,
sem falar,
sem suar,
sem cair,

sem transar,

sem dormir,
sem casaco, sem meia, sem luva, sem toca,

sem tocar, sem ser tocada, sem ser amada, sem estudar, sem ler,
sem te ver,
sem tudo paro de escrever...

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Eu não vejo a hora - Ana Paula Lisboa

Eu não vejo a hora de enjoar de você.

Mas tu parece algodão doce,
Eu demoro pra enjoar,
Posso te comer quilos até isso acontecer.

Eu não vejo a hora de enjoar do seu rosto,
Na verdade, conto os minutos pra enjoar do seu gosto.

Mas tu é que nem doce de leite,
Eu demoro pra enjoar,
Posso te lamber quilos até isso acontecer.

Você é como musica djavaniana.
Eu ouço, ouço, mais rápido, mais lento,
Varias versões de você, na boca de outros,
De outras, na minha boca,
até o caroço, até a ultima gota de gozo.
Mas depois enjôo.

Mas tu é que nem dançar coco,
Eu demoro pra enjoar,
Vou suar muito contigo antes disso acontecer.

Eu quero enjoar logo de você.
Do seu cheiro, da sua mão no meu cotovelo,
Do seu abraço apertado, do seu chinelo de dedos.

Mas tu parece aquela blusa verde que eu amo,
Eu ainda não enjoei de usar,
Posso te vestir muito antes disso acontecer.

Só Quando - Ana Paula Lisboa

Quando eu escrevo é tudo inverdade. Quando eu escrevo quem fala é a minha mão, é a minha palavra gritando estridente. Quando eu escrevo quem fala é a minha boca, faladeira de besteira que me deixa envergonhada.

Eu abro bem os olhos pra não ouvir ninguém, quando eu escrevo, e fecho os ouvidos pra ver todo mundo.

Quando eu escrevo meu joelho direito reclama de eu ficar tanto tempo sentada. Tudo me dói, porque dói eu ter que escolher entre o bom e o ruim, quem fica e quem vai, quem vive e quem morre. Só escolho quando escrevo e por isso escrever é muito mais difícil que viver.

Quando eu escrevo é pra inventar o meu mundo, defeituoso e cheio de palavras soltas , a minha toca do coelho.

Os meus cabelos crescem mais rápido quando eu escrevo e perco 90 calorias por linha escrita. Não preciso beber água e nem comer.

Quando eu escrevo é pra ser bonita, gostosa, pra me convidarem pra posar nua. É por que quero ficar rica, famosa e ser invejada, não escrevo pra parecer culta.

Quando eu escrevo é só por que gosto de ver a minha letra, redondinha, desenhada no papel.
Não escrevo pra ser original, é pra repetir, plagiar, copiar e colar.

Quando eu escrevo é por que estou apaixonada, normalmente por um homem feio e barrigudo.
Quando eu escrevo é por que quero ser pervertida.Quero matar alguém, ou dar pra alguém, mas estou de mãos atadas para as duas coisas.

Quando eu escrevo, normalmente, é por que não encontrei nada melhor pra fazer.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Água de beber - Ana Paula Lisboa

Quando eu estou nervosa eu bebo água. Nada mais me acalma e tranqüiliza. Nem chocolate, nem música clássica, nem abraçar uma árvore, nem mesmo dar berros estridentes e tão pouco quebrar todos os meus pratos.
Não. Quando eu tô nervosa eu bebo água. Encho meu copo de 500ml e respiro fundo no intervalo de cada golada.
Eu gosto da água porque a água não tem gosto, não tem cheiro e não tem cor. E a não-cor da água me acalma. E o não-cheiro da água me tranqüiliza. E o não-gosto dela me sacia.
A água não me atrai em nada e é por isso que gosto dela. Se a água tivesse cor, fosse cheirosa e gostosa eu teria problemas.
Eu ficaria com saudades dela, eu pegaria o metrô errado pra vê-la, eu pensaria em água o tempo todo mas quando a visse eu ficaria parada sem saber se bebo a água ou não.
Graças dou à Deus, que fez a água tão sem graça a ponto de eu escrever para ela.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Categoria - Ana Paula Lisboa

Depois de tanto tempo me veio o novo:
Conversas mesmas de lábios novos,
Lugares novos em relações antigas,
Siglas desconhecidas,
Mãos claras e macias.
A saliva tinha gosto de saliva mesmo,
Misturada com bolo de laranja.
O cheiro tinha cheiro de cheiro mesmo,
Cheiro de gente gostosa que toma banho
Todos os dias.
As categorias ficaram confusas em mim:
O ponto de ônibus podia ser uma bota,
Suco de cupuaçu e suco de acerola
Tinham o mesmo gosto,
O 238 e o 247 faziam o mesmo caminho,
As conversas não faziam nenhum sentido e
O silencio fazia a minha boca gritar pedindo socorro.
Na próxima vez as coisas serão mais serenas:
Eu pagarei a minha divida com gosto,
Não vai ventar frio,
Mas eu acho que o meu silencio vai permanecer,
Pois é no silencio que as coisas acontecem.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Tara - Ana Paula Lisboa

Nutro uma paixão, nada secreta, por poetas.
Homens e mulheres.
Minha tara é puramente antropofágica.
Eu adoraria come-los e adoraria mais ainda dar pra eles.
Esses poetas contemporâneos têm o poder de deixar a
Minha respiração ofegante e fazem com que as minhas coxas se
Contraiam, uma contra outra.
Outro dia cantarolei o mesmo verso de um desses
O dia todo,
Baixinho no ônibus de manhã e depois gritando no chuveiro à noite.
Um poeta me obrigou a roubar.
Roubei um beijo dele e depois lhe disse baixinho
No ouvido mentiras obscenas.
Como castigo nunca mais dormi um sono tranqüilo,
Fico a noite toda com os poemas dele na cabeça.

Sem tempo pra escrever - Ana Paula Lisboa

Pronto.
Consegui parar o mundo pra te escrever.
E eu tinha tanta coisa pra dizer,
Mas o tempo passou e eu esqueci dessas coisas.
Então vou ter que escrever coisas novas,
Coisas que nem eu sei quais serão.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Para além das coisas maiores do universo - Ana Paula Lisboa

Odeio quem me faz chorar.
Odeio quem não me deixa dormir e
Me obriga a acordar cedo.
Odeio quem diz que me ama, que não quer me perder,
Quem diz que não sabe viver sem mim.
Odeio quem me faz sentir uma filha da puta,uma dessas
Que não valem nada.
Odeio quem me deixa estática, com cara de boba
Olhando pro vazio do mundo e refletindo
Sobre todas as merdas que faço.
Odeio quem faz eu me sentir velha
E responsável por todas as mazelas do
Mundo contemporâneo ocidental.
Odeio quem me faz escrever assim,
Escritas reveladoras das minhas fraquezas.
Odeio quem segura meu braço
Como se segurasse minhas asas.
Mas eu odeio bem mais quem
Me faz chorar.
Eu odeio mais, muito mais, quem
Me faz chorar.
Odeio incondicionalmente, incontrolavelmente,
Indiscutivelmente para além das coisas maiores
Do universo quem me faz chorar,
Quem me faz sangrar todas as horas do dia e
Derramar de mim mesma, pelos olhos, minha criptonita.

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

nem quando chega - Ana Paula

até que em fim encontrei alguém que não me ama.
até que em fim alguém que me olha de cara feia e
que não faz questão de me dar dois beijinhos
nem quando chega,
nem quando sai.
sorte minha eu ter na vida alguém tão espírito de porco
e que por não me amar se acha a rainha da cocada branca,
já que eu sou a rainha da cocada preta.

foi realmente uma benção encontrá-la:
de pele alva e cheirosa,
quadris arredondados,
seios grandes, nariz fino,
voz rouca aos ouvidos.
e a melhor coisa do mundo é saber
do seu ódio por mim, é saber da
inveja que ela sente só pela minha simples presença
e ouvir seu coração disparado de desamor.
minha musa zonasulense, se pudesse, me chutaria
com seus sapatinhos de boneca.

eu encontrei o verdadeiro não-amor,
tem gente que busca isso a vida inteira.
e agradeço a Deus todos os dias
a maravilha que é não ter o seu amor por mim.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Memórias de tomar um todinho - Ana Paula Lisboa

Era leite e isso devia me assustar, mas era preto e isso era familiar. Açucarado sabor chocolate, quadradez anatômica, nutrição rica, atração ordinária pela cor. Perfeito para menininhas raquiticas ainda que a mulher corra para verificar as calorias. Canudinho na boca. E o vômito depois de uns três minutos. Tudo hoje, 20 anos depois.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Para um amigo que fiz no escuro – Ana Paula Lisboa

Como ninguém pôde eu posso.
Eu pude e achei que poderia sozinha,
Mas encontrei outros que também puderam comigo.
Um em especial:
Sentou-se ao meu lado e me deu de comer:
Frango e batata frita.
Sem nem ao menos saber que me apaixono
Por quem me dá de comer.
Ele comentava alto,
Me cutucava,
Perguntava das partes que não entendia
E isso me pareceu tão bom que eu só sorria.
Ficamos íntimos
Sem nem ao menos saber seu nome.
E já havia esquecido o meu a essa altura.
Foi um encontro às escuras e
Como eu estava sentada
Ele não pôde olhar minha bunda
E tirar conclusões precipitadas.
Foi obrigado a me olhar nos olhos
Logo no primeiro encontro.
Eu poderia sentir saudades dele,
Desse que alegrou a minha noite
E que fez de um filme sem beijo na boca
Parecer um romance.
É uma pena ser ele tão descartável e
Nem ao menos saber
Desses versos a ele dedicados.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

O Pedro dos meus sonhos - Ana Paula Lisboa

Calma aí. Só mais cinco minutinhos...
O Pedro tinha uns 13 e eu uns 12. Era inteligente com o cabelo louro e liso, de lado, cheio de gel. Um nerd era o Pedro. Pedro era meu tipo quando eu tinha 12 anos. E de olhos verdes lindos. Pedro me olha altivo no recreio e me recita poesias. Pedro eu te amo.
– Ei, 7 horas!
Pedro, à noite eu volto. Você vai estar aqui?

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Esperando-se – Ana Paula Lisboa

Ela me disse desde novinha:
– Não espere demais dos outros, minha filha.

Eu não esperava que mentirosas palavras,
Bem articuladas, ditas bem altas,
Viessem de uma boca tão gostosa.

Eu ignorei. Eu não aprendi. E esfodacei-me.

Delírio – Ana Paula Lisboa

E as borboletas?
Quem não tem cão caça com o que?
Ainda que eu quisesse que
Tudo houvesse ficado
No tivesse.
Quisera eu que a quimera fosse só sonho.
E assim já teríamos acordado.
Só tu.
Eu ia continuar sonhando.
Poderia eu pedir que me esquecesses tu?
Só tu.
Eu quero te lembrar de jamais esquecer
De contar meus nossos segredos.
Ainda que agora eu esteja gelada,
Quase morta, de mãos frias, de dedos duros,
Muda, sem poeira nos sapatos,
Sem dinheiro no bolso.
Desesperada dessa espera tua por me ouvir.

Os medos dele – Ana Paula Lisboa

Ele teve medo e foi a primeira vez, depois de anos aliviados. O pavor foi de tudo dar errado, de escrever em papel pautado, de errar a letra da musica bem em cima do palco.

Ele tem medo de ficar aqui para sempre e de nunca mais andar de trem...
Eu tenho medo de ler poemas dele escritos para outro alguém.

Ele teve medo, numa noite, de que sua avó morresse e também de nunca mais conseguir dormir.

Eu escrevo pretensiosa que
Ele tinha medo de falar comigo, de me abraçar, me beijar de língua, me chamar de linda.

Ele tem medo de sair de casa sem óculos escuros e de não saber voltar.
Ele tinha medo do escuro e vai casar com uma branca, dessas que nunca viu o mar.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

À Tarde – Ana Paula Lisboa

Cadê vc?!!!
fale
voltei
ficou com raiva do que eu falei
?
com raiva?
q isso, nunca ficaria com raiva disso.
e então...
o q então?
por q ficou chateada?
desculpe, não foi chateação. falar isso (ainda mais do jeito que foi) não me fez bem. Eu tentei não pensar nisso ontem, fingir q nada aconteceu me deitar naturalmente... mas agora eu tive q pensar...e isso faz parte, tenho feito muitas coisas sem pensar!
não tinha como não te falar isso,
passar como se nada tivesse acontecido
não dá pra chegar pra vc e não falar o que aconteceu
e tinha que te pedir desculpa por que aconteceu do jeito que aconteceu e com a situação que foi.
eu to com medo de varias coisas, de varias situações, de coisas que eu não sei se vão dar certo e de coisas que ainda nem aconteceram...e aí isso tudo me dá mais medo ainda (faz tempo não sentia medo)
mas eu te entendo sim, e não estou chateada...por nada q aconteceu
e as desculpas não cabem nisso!
desculpas me dão mais medo
então ficaremos como estamos
ta
então podemos tirar das nossas cabeças essas "desculpas" então
?
pelo amor de Deus
se tu pedir desculpas de novo, paro de falar com vc pra sempre!
uahuahuhauhauh
ok
então não pedirei
uahuahuahuah
ok?
melhor assim...
almoçarei...
ok
estarei aki esperando
voltei...
opa
oi?
vorto?
estou aki
sim...sim...
kkkkkkkkkk
engraçado esse trem de sim, sim
hahahahahahah
engraçado como coisas que não eram para ser,
acabam sendo...tipo o sim, sim...que virou palavra de poema!
não entendo
“matéria de poesia” com diria Manoel de Barros, mas desculpe,
vc não é o amigo das reflexões filosóficas
vc é o amigo das gargalhadas, das reflexões político-sociais, das tardes pervertidas, do apego melancólico, do segredo e das confissões sobre os meus medos.
Espero não perder isso quando o tempo passar!
não perderá
então tá...
ah, eu tinha q te fazer uma proposta.
vamos a ela...
qual proposta?
Essa...sem pretensão e até sem futuro...só pra experimentar...e queria te xamar pra ir junto.
seria ótimo
quando e como?
não sei...breve por favor, pra vontade não passar...e eu queria que tivesse um tema.
legal
já sabe qual?
eu só xamei vc
e o resto?
puxa, vamos pensar numa solução! sei lá...tava até falando isso esses dias, queria coisas que fossem só minhas...
bem...
preciso ir
perfeito, bju!
valew
beijin
te amul
tb te amu!

(off line)

Confirmações – Ana Paula Lisboa

Sim, sim.
Pois sim.
É.

É dessas pessoas falsas que sorriem
No intervalo de pequenas falas.

Sim, sim.
Qual pessoa traira que transa
Com o namorado da melhor amiga,
Que tira doce da mão de criancinhas.

Por que não?
Ser dessa infiel com a vida, que
Come uma folha de alface achando que é
Comida.

É.
Eu faço coisas desagradáveis para agradar,
Calo a boca quando é para gritar
E tenho prazeres em lugares escusos.
Pois sim.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

A Mudança – Ana Paula Lisboa

Eu ainda posso te contar tudo.
Você ainda pode falar baixinho.
E a gente ainda pode se olhar,dissimulados,
Entre todas as pessoas do ambiente.

Eu não posso mais gritar alto.
Você não pode mais me falar no ouvido.
E a gente não pode mais gargalhar, abraçados,
Entre todas as pessoas do ambiente.

Eu sei que ninguém sabe.
E você sabe mais que eu,
Que qualquer beijo ou “oi”, mal calculados,
Excluiria todas as pessoas do ambiente.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Pé de Alface - Ana Paula Lisboa

A gente se perde e se ganha no segredo,
Ganha um cardume do Mar Vermelho,
Um vestido cor de alface.

Calmo, sereno, lento, suave?
Tome um antialérgico,
Com suco de maracujá e
Um pé de alface verde.

Um suspiro alto.
Um gemido baixo.
Uma falta do que fazer.
“Uma dor que desatina sem doer.”
Um vazio no peito.
Uma escrita sem jeito.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Passando a vez - Ana Paula Lisboa

Passando frio
Dormindo pouco.
Ficando gorda
Passando fome.
Passando o tempo
Fazendo besteira.
Exalando loucura
Passando e-mail.
Passando mal
Bebendo água.
Passando na prova
Esquecendo as coisas.
Ficando alérgica
Passando blush.
Passando a guarda
Procurando abrigo.
Passando roupa
Sonhando demais.
Secando as lagrimas
Passando o rodo.
Limpando a vista
Passando fio dental.
Passando rimel
Lendo jornal.
Passando a régua
Vivendo.
Passando vírus
Falando.
Passando a limpo
Escrevendo.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Velhacos - Eu mesma

Aí em baixo você vai encontrar uns textos que já eram para estar aqui há um tempo. Junho foi um mês de poucos posts, do desapego, da gritaria, do tédio e de uma escrita muito melancólica. Meus patinhos feios, e como se sabe, filho feio não tem pai. Somente um nasceu com fenótipo de princesa: "Clarinha", só por que tentei imitar a lindeza da homenagiada. Mas agora parei de ter vergonha dos meus filhos, eis aqui, depois de uma plástica é claro, por que a beleza é fundamental. Fique a vontade.

Solamente - APL

Eu não te olho só.
Eu não te olho e só.
Eu não te vejo só.
Eu sempre te vejo cercado,
Amado, querido, ouvido e desejado.
Não vou suprir suas expectativas,
Tu não és só.
Só que já foi melhor.
É só olhar...
Escreves só porque queres,
Eu estava aqui, eu estava ali
E eu estava lá.
Contra tudo e contra mim,
Eu estava lá, eu estava ali.
Não esqueça da promessa
De escrevermos juntos.
Não esqueça da promessa.
Eu prometo.
Nunca fui boa em promessas...
Prometo ser essa a ultima vez
Que toco no seu nome.
Agora vou escrever a sós,
Sem a sua companhia em
Nenhuma parte do meu
Eu- Lírico.
Vou voltar a te olhar e
Pensar: Só?
Dramática eu?
Só eu?
Me deixe só.
É só.

Inveja I - Ana Paula Lisboa

Eu invejo os contentes, os satisfeitos.
Eu cobiço os saciados, os feitos.
Queria sentir o prazer dos realizados,
Dos que não precisam de mais nada
E não ambicionam mais a existência.
E admiro os normais, os certos,
Em quem não falta um parafuso sequer.
Eu me dôo quando olho para os que não
Tem desejo, para os completos.
Eu devo ser a errada em querer,
Por desejar ardentemente possuir.
A avidez é um pecado junto com a cobiça.
Mas eu não cobiço o que é dos outros.
Eu cobiço o que é meu,
O que me pertence,
O que me é de direito.
Apetecer é verbo transitivo.
E eu sinto uma fome insaciável.
Fome antropofágica de comida
Humana indecifrável.

Para ser legenda - Ana Paula Lisboa

Em breve escreverei sobre nós.
Sobre a saudade febril que sinto
De nossas mãos entrelaçadas.
O tempo não importa,
Quando voltamos a estar juntos
Ele não irá ter passado.
A minha Babilônia particular,
O meu guardador fiel,
Uma hora mais e outras menos.
Com quem eu morreria abraçada,
De quem eu comeria na mão,
A quem eu daria um filho,
Com quem eu mais gosto de brigar e
Para quem eu sempre volto
No fim do dia.
Mas por enquanto fique com esses versos,
Feios e sem graça,
Assim que aprender a escrever bonito
Escreverei sobre tudo de nós.

Dígrafo - Ana Paula Lisboa

Mexe e remexe que mexe
Com o meu coração.
Bem assim, igual a uma menininha,
Tão sutil.
Bem assim, como um furacão,
Tão febril.
E tu não passas de um H
Na minha vida,
Em nada me presta alem do dígrafo.
Com o meu A tu não falas,
Porém com o meu N e meu L
Tu se fartas.

Desapaixonando-se - Ana Paula Lisboa

Desapaixonar é verbo transitivo.
Ou será intransitivo?
Não, ele precisa de complemento.
Direto. Ou indireto?
Preposições são sempre bem vidas,
Qualquer ajuda é amiga nesse momento.
Pronto.
VTDI

Desapaixonar-se é trabalho de casa de Física.
E deve ser feito
No dia em que vai passar seu filme
Favorito
Na Sessão da Tarde.

Desapaixonante é aquele emprego
Que te não te dá tesão.

Desapaixonação é o ato de conversar
Com aquela pessoa desconhecida
No ônibus com o transito parado.
Ser obrigada a ouvir tudo sobre sua vida,
Todas as doenças passadas, presentes
E futuras dela e dos filhos.
E a sua maior vontade seria só
Olhar a poluição do lado de fora.

Desapaixonite é uma inflamação
Que pode aparecer nas mãos, no cérebro e no
Coração.
Ela te bloqueia o escrever bonito e o que
Presta
Para a Literatura Brasileira Contemporânea Pós Moderna.
A pessoa contaminada fica um mês ou mais,
Dependendo do estagio,
Escrevendo apenas poemas como esse.

O melhor tratamento é o repouso cerebral.
E nem pense em ir a cemitérios, especialmente os de
São Paulo.
Os mortos de lá sentem o cheiro de poetas como nós
De longe.
Mas até mesmo o Carlos tem um poema
Chamado “Patético”.

Coisinhas - Ana Paula Lisboa

Há coisa que mexe fácil e
Há coisa que mexe difícil.
Para isso:
Tem colher de pau
E tem colher de sopa.
Eu sempre peço uma colher de chá.
E tem faca de manteiga.
Tem faca de pão.
E tem gente que só usa a peixeira.
E tem peixe de rio,
Tem peixe do mar.
E tem quem pesca em lago particular.
E tem o que é particular,
Tem o publico,
Que é aquilo que conto pra todo mundo.
E tem a rua,
Tem a calçada
E eu subo no palco descalça.
E tem palco que dança.
Tem palco que treme
E tem palco que encanta.
Tem encanto de hora certa e
Tem encanto inesperado.
Tem encanto que faz poesia.
Tem poesia de hora errada,
Tem poesia que vem picada e
Tem poesia que se escreve sozinha.
Tem sozinho de hora marcada,
Tem sozinho que queria ser junto
E tem sozinho bom de escuro.
Tem escuro que é de dia.
Tem escuro que queria ser claro,
E tem escuro de escrita.
Tem escrita em papel solto,
Tem escrita que é mentira,
Tem escrita que é louca.
E tem louco pra tudo.

Clarinha - Ana Paula Lisboa

Tão alva e
Tão bela e
Tão clara.

Tão clara e
Tão bela e
Tão calma.

Tão serena.

Tão da lua e
Tão mar e
Tão chão de terra.
Tão pé no chão
Que parece voar.

Tão flor e
Tão mato e
Tão da rua e
Tão de fato.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Sábado - Ana Paula Lisboa

Banho gelado para acordar.
Uma pedra de gelo para chupar.
Mas na verdade eu prefiro quente.
O quente do nós,
De mim, da minha fé,
Do cobertor, do casaco felpudo que me dá alergia,
Da meia, do edredom de casal,
Do perdão e do esquecimento desmemoriado.

Travesseiro - Ana Paula Lisboa

Meu travesseiro já está cansado e disforme.
Ah, se meu travesseiro falasse...
E eu, farta paralítica, espero mesmo que ele continue mudo.
Um travesseiro falante seria o meu fim.
Ele falaria dos sonhos,
Das lágrimas,
Do imenso ódio,
Dos versos nunca escritos,
E pior,
Dos pensamentos impensados.
Aqueles que andam, giram, viajam e
Terminam sempre no mesmo lugar.
Aquele lugar daquela lembrança
Daquele dia que nunca aconteceu.
Por isso sempre morei em casas,
Dois andares já me bastam.
Residir em prédio me daria uma imensa vontade de voar.
E aqueles segundos breves de vôo livre,
Antes de me estatelar no chão,
Seriam perfeitos.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Janela Ensolarada - Ana Paula Lisboa

Chave é elemento decisivo.
Quem me abre quando estou fechada,
Quem fecha minha boca
Quando falo demais.

E, se com Lídia não estais de mãos enlaçadas,
Enlace as suas mãos comigo.
Enlacemos as mãos?

Se me esqueço de tudo,
Se me jogo na cama de banho tomado,
Se tranco todas as portas do quarto,
Eu ainda posso pular uma janela.

Aquela nossa janela ensolarada que pisca todos os dias.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Meu eu - APL

Desculpe.
Me perdoe.
Reconsidere, por favor.
Eu prometo que isso não acontecerá novamente.
A partir de agora permanecerei calada.
Eu não o incomodarei mais com as
Minhas dores de cabeça e o meu mau humor.
As caretas serão substituídas
Por um sorriso largo e falso.
O sono e o tédio se transformarão em
Energia contagiante.
Nada de testa franzida,
Nada de olheiras.
Eu sei fingir direitinho...
E afinal, quem quer o meu eu?

segunda-feira, 28 de junho de 2010

O meu mal - Ana Paula Lisboa

Permanecerei tranqüila e serena.
Sem nada para falar e nem para ouvir.
Somente o silencio do meu estômago
Roncando alto.
Feroz como eu,
Mal humorado e nocivo.

Estarei relaxada durante todo o dia.
Ainda que toda a tecnologia do mundo
Me odeie e que eu queira sair correndo
Cheia de fome e morda alguém pela rua.

“E agora, quem poderá me defender?”
Música doce aos ouvidos,
Conversas gostosas aos dedos,
Paixões melodramáticas ao peito
E açúcar no sangue.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Só para estar vivo - Ana Paula Lisboa

Tudo culpa de uma boca que só
Diz coisas mal ditas.
Foi reclamar do tédio,
Da melancolia
E tudo foi me acontecer
Numa quarta feira
Que nem era de cinzas.
Nem poderia.
Quando o corpo resolve arrepiar, pronto,
Está feito.
Supondo que não haveria mais segredos para contar,
Supondo que eu morreria de fome
Eu supus um beijo.
E agora estou aqui, segredando
Mais uma vez contigo minhas imperfeições.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Úlcera - Ana Paula Lisboa

Da cor do ébano, agradável aos olhos e
Escreve ainda.
Tão completa e complexada.
De versos livres e poucos,
Exacerbadamente prolixos.
Muitas vezes fastidiosos
Mas sempre festeiros.
Em todo o tempo enfatizados pelo não,
Quase sempre pelo talvez e
Jamais pelo sim.
Nunca o sim verdadeiro e verdejante.
Pode-se ouvir, ao longe, um uivo
Melancólico e sublime,
Enfadonho.
Dor de uma úlcera profunda
E quase parnasiana.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Desabafo - APL

E eu aqui, nua, na chuva, escrevendo em prosa.
Eu só estou cansada. Que droga!
Escrever essas coisas me deixa ainda mais irritada, com mais ódio.
Estou cansada de ouvir essa voz chata, irritante, gritante,
Que só fala do que não sabe.
Eu quero uma morte rápida, indolor, que ninguém se importasse,
Num caixão de madeira vagabunda, numa cova rasa, sem flores
E velas.
Minto.
Quero um velório de três dias, com fila na porta.
Quero rios de lagrimas derramadas, e quando a água secar,
Todos verão o sal na calçada.
Quero coroas de flores, quero milhares de velas e
Quero poesias declamadas nas portas.
Eu poderia escrever sobre assuntos relevantes:
Flores, crianças brincando,
Domingos ensolarados, noites estreladas,
Sobre o amor encontrado, o amor impossível,
Sobre a vida na França, um passeio de barco.
Mas não:
Falo de agonia, de dor, de morte matada,
De morte morrida, de choro velado e sobre pneumonia.
Eu não deveria ter me alfabetizado.
Mas vou parar de te incomodar.
Mesmo que doa, mesmo que eu me desmanche,
Mesmo que nada dê certo
E ainda que eu não tenha nem onde dormir.
Ou paro ou morro de vez.
Arranco fora as duas mãos e a língua
E os olhos e as orelhas e os pés.
Faço uma sopa com tudo e vendo na esquina,
Talvez alguém queira me comer.
Talvez.
Talvez eu sirva para alguém.
Talvez.
Talvez eu queira dar para alguém que pague.
Eu posso?
Os meus pés deviam correr,
Mas ficam aqui me olhando com cara de bobo,
Esperando sei lá o quê.
Eu não tenho nada aqui.
Nem pai, nem mãe, nem amigo, nem marido.
Eu me divorciei de todo mundo.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

" A morte é a inventora de Deus"

Pausa. É só notícia. José Saramago morreu hoje... Como eu não saberia escrever nada que pudesse chegar a homenagia-lo (pois ele é - ou era?- tão maior) vou ficar em silencio.
Deixarei que ele fale:

"Nada há que seja verdadeiramente livre nem suficientemente democrático. Não tenhamos ilusões, a internet não veio para salvar o mundo."

"Eu sou um comunista hormonal, meu corpo contém hormônios que fazem crescer minha barba e outros que me tornam um comunista. Mudar, para quê? Eu ficaria envergonhado, eu não quero me tornar outra pessoa."

"Se eu pudesse repetir minha infância, a repetiria exatamente como foi, com a pobreza, com o frio, pouca comida, com as moscas e os porcos, tudo aquilo."

"Não sou pessimista. O mundo é que é péssimo."

"Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara"

"Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos."


No coração, talvez

No coração, talvez, ou diga antes:
Uma ferida rasgada de navalha,
Por onde vai a vida, tão mal gasta.
Na total consciência nos retalha.
O desejar, o querer, o não bastar,
Enganada procura da razão
Que o acaso de sermos justifique,
Eis o que dói, talvez no coração.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Carta Resposta - Ana Paula Lisboa

http://ensaiosdamenteinsana.blogspot.com/2010/06/havana-allyson-alves.html

Rio, 15/06/10.

Caríssimo, não havia melhor momento para receber sua carta. Tenho passado noites geladas por aqui e ler suas palavras aqueceu meu coração, como sempre.
Desculpe a demora da resposta mas não queria escrever de qualquer jeito. Queria parar, pensar em você, lembrar do seu rosto - com e sem barba. Aí demorou para esse tempo acontecer mas finalmente chegou!
Na verdade agora é madrugada (3:27) e eu acabei de sonhar contigo. Sonhei que dançávamos salsa, não consegui mais dormir e vim escrever. Daria tudo para te ver tocando aí e dançando também, eu imagino. Outro dia fui lá naquela Salsa, lembra? Eu me lembro. Noite inebriante aquela...
Que saudades...Nossa 2 anos?! Como diria Luiz Gonzaga, ela amarga como jiló e como não sei cantar pra remediá-la, eu continuo escrevendo pra ver se passa.
As novidades: o livro está no forno e estou ansiosa pra ter esse filho nos braços, está sendo um parto mesmo. Sabrina e Toni se casam em Agosto e você bem que podia vir. Já não basta ter faltado ao MEU casamento?
Hum...quer dizer que os negros (as) daí são bem bonitos... Alguma em especial? Ah, fala logo...conta...conta...
Penso que estamos em cidades trocadas, pois se o frio me mata e o calor te incomoda? Que falta me faz o sol, estou ficando branca! Mas quem sabe eu não vá até você antes do Natal? Preciso mesmo de férias e tu sabe da minha imensa vontade de conhecer Cuba. Quem sabe...?
É lindo ver o tamanho da tua felicidade e saber que tu merece tudo isso. Minha memória está repleta de nós.
Ah, liguei pra sua mãe ontem e marcamos de nos ver no Domingo, almoçar, beber vinho, falar mal de você...essas coisas.
Agora eu vou tentar voltar para o sonho, porque amanhã dou aula bem cedo. Tenho um aluno que me lembra muito você: cabeludo, vive com um violão pra cima e pra baixo e só me faz perguntas intrigantes.
Não deixe de dar notícias...escreva mais...Foi muito bom ouvir sua voz e sentir seu cheiro, quase te tocar.
Beijos ensolarados.

Ana

Ps : Por que Castilho?

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Culpados - Ana Paula Lisboa

Em noites de lua cheia e clara como essa
Eu até chego a sentir falta.
Não é saudade.
Não, é só um cutucão no braço esquerdo,
Na minha memória.

A saudade pode ser do beija-flor,
Da escrita apaixonada,
Do suor em noites geladas,
Da leitura com o coração disparado,
Do meu segredo mais bem guardado
Que contei para todo mundo,
Porém ninguém soube ler.

Mas deixe pra lá, a culpa não é minha,
Não é sua.
A culpa é da lua

Banho - Ana Paula Lisboa

Tome logo esse banho,
Que depois que comes,
Nem mesmo guincho te carrega.

Esfregue essa cara suja pelo tempo e
Que só brilha pelo suor de um dia inteiro.
Lave bem as coxas, cansadas de serem
Espremidas naquela calça barata.

E por favor, não esqueça de lavar
Atrás das orelhas,
Onde o pretume já acumulou

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Eu-Lirico (a) - Ana Paula Lisboa

Agora eu sei que não sou Ela.
Porque a que escreve não é a mesma que fala.
Porque a mão que fala não é a mesma que bate.
Eu não preciso ser Ela,
E é melhor mesmo não ser,
Ainda que assim ninguém nos entenda.
Se eu fosse Ela, não escreveria nada,
Não seria boa em nada.
É melhor ser personagem,
É mesmo bem melhor não ser eu.
Eu a inspiro,
E é por mim que Ela escreve,
Mas ao chegar ao fim da linha
Não é mais de mim que Ela fala.
Nossas brigas diárias,
Nossa pancadaria frenética
E a paz é o pior que podemos ter.
Onde há briga há a alegria.
Quando há briga há poesia.

sexta-feira, 28 de maio de 2010

A Musa - Ana Paula Lisboa

Musas são aquelas a quem se
Deseja mais que o respirar.

Musa é a aparição viva da
Perfeição, da lindeza, da formosura,
Do caráter e da postura.

Musas são alvas,
Biondas de olhos verde-mar.

Musas são Helenas,
Penélopes, Emanuelles, Gabrielas.
Meu nome não se compara ao delas.

Mas se um dia a suspirar resolvo escrever,
Serei musa então,
Musa minha da imperfeição.

A Roda - Ana Paula Lisboa

No inicio tudo era a roda e
A roda só girava.
No meio era a roda que andava.
No fim a roda falava alto e xingava.

A roda já bêbada,
Mas ainda assim dançava.
A roda já exausta,
Mas ainda assim tocava.

A roda suava sem e roupa no frio
De sorriso aberto a estranhos bem conhecidos.

A roda que clareava a noite e que
Raiou o dia.

A roda que faz dos Pretos, pretos.
E dos Brancos, quase pretos,
Mais Pretos ainda.

A roda me girou, porque noite assim
Não se perde, não se bebe de graça.
A roda gigante me engoliu de prazer
De tanto cantar...
Tô nos braços de mamãe,
Vai dizer ao meu amor que eu não vou pra casa agora.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Vão - Ana Paula Lisboa

Oh Deus, e quantas mulheres escritoras eu conheço?
E quantas escritoras, mulheres, negras eu li, oh Deus?

Mas quem sabe me comprem pelo nome.

Pensando em ser talvez, e me esperançosa me vejo,
Uma parenta distante do Fernando,
Ou uma amiga íntima do Zé.

Eu posso mentir.
A verossimilhança me respalda,
Eu posso inventar.

Grande nega pretensiosa é o que sou!

Não comprarão,
Não lerão,
Nem uma critica sequer escreverão.

Permanecerei inerte na prateleira escondida,
Espremida entre outros tantos,
Aquele livro negro e magricela.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Candeeiro de um bico só - Ana Paula Lisboa

Eu tenho dois
Amores,
Que são mui
Diferentes.
Um quase sempre me deixa
Triste,
O outro é raro me deixar
Contente.

E nós, juntos na mesma
Cama,
Ouvimos os julgamentos dos
Normais.
“És mesmo uma louca
Ana”
Somos todos loucos
Demais.

Os simples passeios são
Complexos,
Terminam sempre em
Porrada.
Um terceiro ou quarto me
Chega,
E eu mordo de
Desejada.

Mas agora planejo o
Fim,
Exausta de tanta
Confusão.
Foi num sonho que me veio,
Imaginei a morte,
Trágica:
Veneno no feijão?

O pretérito me
Condena,
Só agora reparei.
Se eu reparasse
Antes,
Não matava os que
Amei.

terça-feira, 25 de maio de 2010

733NW - Ana Paula Lisboa

Eu tento olhá-lo com os dois olhos
E ele me olha.
Eu o encaro quase de olhos fechados
E ele me encara com seu único olho
Bem aberto e luminoso.

Os pretos são os mais cobiçados por todas
E todos.
E o meu é lindo assim...

Olhando o meu amado 733NW todos os dias,
Eu percebo como cheguei ao fundo do poço,
Me banho na banheira do álcool, altamente viciada em craque
E totalmente sem noção.
Ao ponto de escrever poemas para o meu monitor.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Cofre - Ana Paula Lisboa

Os meus melhores pensamentos são teus...
Teus maiores jeitos são meus.
Eu te daria tudo que me pedisse...
Eu largaria tudo se quisesses...
Eu te faria um filho...
Eu poderia te contar tudo isso
E te olhar nos olhos,
Tudo ao mesmo tempo.
Mas seria pouco.
E o desejo,na
Nossa geração, querida,
É coisa para guardar em cofre.

Especulando - Ana Paula Lisboa

Especuladora eu vejo.
Logo eu, narradora de primeira pessoa,
Aquela que não sabe nada da História,
Da historia ou da estória.
Não nasci machadiana, que pena.
Estou no meio do matiz
Entre a bondade e a maldade.
Eu só acho, penso que, vivo supondo.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Não encontrei um titulo e não quis pensar em um - Ana Paula Lisboa

Até que enfim aconteceu.
Depois de meses de uma espera incansável.
Eu cheguei a pensar que nunca chegaria,
Mas o momento chegou.
Eu vi o instante em que tudo desmoronou.
E nem doeu como eu pensei que sentiria,
Foi rápido, como sempre é.
E até que foi fácil...
Dessa vez eu ouvi em alto e bom som,
Foi bem claro aos ouvidos.
Minhas suplicas foram percebidas,
Minhas preces foram atendidas.
Foi insosso, incolor e insípido.
Foi como um balde d´água.
Mas minha mãe me educou a banhos frios,
E eu prefiro,
Até mesmo em noites geladas como essa.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Inveja - Ana Paula Lisboa

A inveja é coisa estranha.
Bate na gente do nada
Basta uma olhada e eu me vejo mordendo os lábios.
Uma vontade de gritar: Eu também quero!
Me dá aí, só um pouquinho...
Mas espere.
Eu não preciso ter inveja!
Eu escrevo!
Eu posso ter qualquer coisa, posso dizer qualquer coisa,
Posso viver qualquer coisa, em qualquer época,
Eu posso mentir, eu posso inventar, eu posso sonhar,
Eu posso amar qualquer um, eu posso ser qualquer uma!
Morra de inveja!

terça-feira, 18 de maio de 2010

Consulta Médica - Ana Paula Lisboa

Uma consulta medica pelo amor de Deus!
Um cardiologista.
Um angiologista.
Um ginecologista.
Um dermatologista.
Um dentista.
Um geriatra.
Um pediatra.
Um otorrinolaringologista.
Um oftalmologista.
Um ortopedista.
Um psiquiatra.
Não necessariamente nessa ordem.
Nada de clínicos!
Quero uma consulta para cada dor,
Um medico para cada amor.
E todos homens, por favor.

- Oi, bom dia .Já tem medico para escritor?
- Sim, qual a especialidade?
- Poesia.
- A senhora tem consulta marcada?
- Claro! Marquei há 3 meses, estava lotado...
- O corredor deverá seguir,
E a terceira direita virar.
Após uma porta negra,
Uma branca irá encontrar.
Não entre na porta negra,
Pois essa é a porta errada.
A branca é a porta certa
O doutor estará na entrada.
- Obrigada.

Aprendendo a Ler - Ana Paula Lisboa

A minha boca olha, mas não sente o gosto.
O meu ouvido vê, mas não ouve.
Os meus olhos sentem, mas não vêm.
O meu corpo ouve, mas não sente nada.

A minha poesia é assim tão Ana-Crônica?
Dicotômica? Bomba atômica?
Eu sinto o gosto pelo ouvido,
Ouço mas não degusto nada.

Ando lendo uns textos novos.
Novos só para mim por que todo mundo
Já conhece.
Novas histórias, novas cores, novos sons, novos sabores.

Os antigos eu leio, leio, leio, releio, desleio e torno a reler.
Mas não ouço nada!
É um texto sem voz,
De um autor mudo e analfabeto.
Cheio de verdades falsificadas.
E que não me inspira mais.

Pura burrice minha!
Sempre matava as aulas de interpretação de texto.
Ai, se eu soubesse que elas serviram para entender tanta coisa no mundo...
São os meus olhos que não aprenderam a escutar.
Ou os meus ouvidos cegos?
A minha boca sentiu o gosto uma vez, mas foi só uma.
E o meu corpo sentiu o tato uma vez, não, foram duas.
E depois disso eu não deixei mais de ter vontade.
Eu queria mais, mas o mais me foi negado.
- Sentir muito faz mal menina!
Ou
- Esse negocio de ter sentimento não é para você!
Ou ainda
- Quem mandou você sentir isso? Que coisa feia!

Tomada - Ana Paula Lisboa

Eu tomo.
Eu tomaria.
Tomara.
Tomada.
Nem lembro a primeira vez que tomei.
Acho que foi no parto, quando
Tomei a decisão de sair.
Minha primeira cisão foi a de separação.
Depois daí foi cisão atrás de cisão.
Corte atrás de corte.
E eu tinha que tomar e continuo tomando.
E decidi sair e decidi ficar.
Decidi ficar mas não decidi andar.
Ando andando sem rumo.
Tomo caminhos tortos.
Tomo as coisas dos outros.
Tomo satisfações.
Me tomo de emoções.
Tomo ônibus.
Tomo meu lugar.
Tomo remédio.
Tomo ares.
Tomo uns tapas na cara.
Tomo um copo d`água.
Tomo sustos.
Tomo no colo.
Só não tomo decisão.

vá - Ana Paula Lisboa

vá.
vá embora mesmo,
vá caçar teu rumo,
mulher sem razão.
mulher que não vale o prato que lava.
e tu não vai por que queres não, eu estou te mandando embora.
eu é que não te quero mais aqui.
é, sou eu!
eu que não te quero mais.
pode ir.
volte de onde veio, pelo mesmo caminho.
ainda está aqui?
corra, corra...
leve seus trapos.
tudo o que trouxe.
não, esse vestido fica,
fui eu que paguei.
tu só vai levar o que trouxe.
nada.
apenas seu corpo sem dono

segunda-feira, 17 de maio de 2010

A hora - Ana Paula Lisboa

Um frio na barriga.
Um arrepio na espinha.
As mãos que tremem.
O coração que acelera.
E eu estou esperando...

Agora é hora?
Não.

E agora?
Não.

E agora já é?
Ainda não.

Agora é, né?
Já disse que não!

Quando for a hora eu
Quero ser a primeira a saber.
Pode me ligar, mesmo se já
For madrugada.
A madrugada é a melhor hora!

- Ana, é agora!

- Ah, agora deixa, eu não quero mais...

Quadrilhas - Ana Paula Lisboa

Segunda fomos ao cinema.
Na terça dançamos num bar.
Na quarta ficamos e casa,
Na quinta eu só quis te beijar.

Sexta assistimos ao circo,
No sábado eu não lembro o que fez.
Mas lembro-me que no domingo,
Saímos juntos outra vez.

Segunda, quarta e até domingo,
Que é o dia do Senhor,
Eu continuo sonhando,
Me faça acordar, por favor.

Terça, quinta e sábado,
A sexta não posso esquecer,
Todos os dias sem falta,
Eu durmo só pra te ver.

Passei as noites contigo,
Todos os dias da semana,
Mas eu só estava dormindo,
Sonhando e sozinha na cama.

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Estiada - Ana Paula Lisboa

Uma estiagem longa acontece em minha cidade.
Há tempos não chove.
As plantas secaram...
O Rio parou de correr...
Caminha lentamente como um velho.
De vez em quando nubla
Nuvens negras e carregadas.
No inicio quando eu as via meu
Coração se enchia de esperança.
Eu voltava a ser menino que espera
O fim de semana chegar.
Mas eu cansei de esperar,
Nunca acontece nada,
Nunca chove!
O tempo me deixou mais seca que o solo.
Sempre ele!
Amarraram-me as mãos e os pés.
Ataram-me uma pedra no pescoço.
Mas não havia Rio profundo o suficiente
Para me atirar.
A minha tristeza é a do pescador que
Vê o seu ganha-pão morrer e nada pode fazer.
A minha tristeza é a das crianças que em outrora
Comiam fruta do pé e agora não tem arvore pra subir

Janelas - Ana Paula Lisboa

As minhas janelas estão abertas.
Vem, pode vir!
Vem olhar a banda passar comigo.
Vem ver o que há de bom para se olhar.
Mas o olhar é só para quem quer ver.
Os vidros estão meio embaçados,
Empoeirados pelo tempo.
Sempre ele!
Nada que uma pedra de sabão
E uns panos úmidos não resolvam.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

ANTI (minha) EVASÃO - Ana Paula Lisboa

Eu também não vou.
Pedirei contigo,
Suplicarei junto
E chorarei muito mais que tudo.

“Não vou para Pasárgada!”

Me jogarei ao chão também,
Mas como criança birrenta
Vou bater os pés bem forte.

Tenho uma faca em punho
E a Palavra escrita no pulso.

Vou ficar aqui!
“Não vou para Pasárgada!”

Eu posso passar ferias,
Talvez uma breve temporada.
Mas meu lugar é aqui.

Não é por opção,
é por escolha.
Eu escolhi ficar!
Aqui é o quartel da resistencia.

Berrarei.
Gritarei.
Matar será a menor das coisas que farei.

Eu estou cansada sim...mas
Os que estão comigo não me
Deixam abandonar a luta armada.

Já perdi uma perna nessa guerra.
Ganhei um tiro no coração.
Fui torturada, marcada a fogo
E a ferro como gado.
Mas eles erraram ao me deixarem
Os braços intactos e não me mataram a
Imensa fome de escrever.

“Não vou para Pasárgada!”


Versos inspirados no poema “Anti- Evasão” de Ovídio Martins

terça-feira, 11 de maio de 2010

Velhaco - Ana Paula Lisboa

Velho.
Velhaco.
De sempre piadista de sempre,
E velho.
Reclamão e bem chato.
Mas eu gosto.
Vai ver acostumei.
Acostumei com a cor,
Com o cheiro,
Com o cabelo.
A gente sempre se acostuma,
E eu sempre me acostumo rápido.
Dormir de madrugada,
Beber caipirinha, escrever poemas em mesa de bar...
São coisas que me acostumo rápido.
Velho, velhaco, chato, mas sóbrio.
Que pena!


RJ, 21/04/10

Um miado - Ana Paula Lisboa

Os gatos são mesmo uns loucos.
Eles brincam sozinhos
No maior divertimento do mundo.
Fazem acrobacias sem ninguém ensinar.
Te olham torto, te olham meigo...
E amam até quem não os ama.
Sobem em cima da cama
Sem que ninguém convide!
Mordem as coisinhas e tem
O rabo arrepiado.
E fazem tudo isso só para
Agradarem seus donos.
Os gatos quase sorriem...
Ah, e eles miam também!

Segredo - Ana Paula Lisboa

Hoje já não me importa mais o tamanho
Da Felicidade.
Não me importa se a felicidade é
Passageira ou se ela vai
Durar para sempre.
Eu não pensei que fosse tão fácil!
Hoje eu estou feliz e foi por tão pouco.
Eu só me lembro de ter comprado um livro novo,
De ter ouvido minhas musicas favoritas,
De ter gargalhado com meus amigos,
De ter beijado minha mãe e
De ter feito um almoço pro meu amor.

Eu posso fechar os olhos e acordar com
Você do lado depois de uma bela noite.
Eu posso sonhar com o que eu quiser,
Eu posso escolher o que viver,
Eu posso optar por quem eu quero ser hoje.
Eu posso viver qualquer coisa,
Eu posso escrever qualquer coisa.
Mas não posso divulgar...
Eu posso ter ciúmes,
Eu posso sentir qualquer coisa,
Ninguém tem nada a ver com isso.
Até posso sentir Felicidade.
Mas não posso divulgar...
Tem muito invejoso por aí!

É melhor assim.
O segredo faz meu coração bater
Mais rápido, me deixa na boca
Um gosto de...
Ah, vocês sabem...
Quem não tem segredos para contar
E para guardar?
Eu adoro me sentir um baú
Cheio de tesouros.
O meu maior tesouro é essa
Felicidade segredada com poucos,
Compartilhada com todos que me lêem
E entendida pelos poucos que me conhecem.

Isto - Ana Paula Lisboa

Isto não é uma poesia.
É só um conjunto de palavras
Que terminam antes do fim da linha.
É bem verdade que nunca escrevi poesia.
E é ainda mais verdadeira a afirmação de que
Nunca escrevi nada.
Pelo menos nada que preste.

E vou continuar assim!
Parada.
Sem escrever...

Mentira!

Hoje escrevi quatro, só não sei
Se posso chamá-los literários.
Com certeza não.
E só estou escrevendo agora para escrever que não gostei de escrever.
Tudo ruim, sem jeito, sem ritmo, sem som, sem nada.

Chega de escrever coisas doidas, coisas de gente maluca, de pessoas desequilibradas.
A partir de agora só vou escrever coisa bonita, fácil, simples e perfeita.
Vou parar de escrever doideira.
Parei com poesias fora da Norma!

Agora vou me encher de assonâncias...
Aliterações...
Rimas trovadorescas...
E só vou falar em português arcaico,
Aquele que apenas a Rainha Louca entenderia.
A estilística passará a enriquecer minhas palavras.

Sonho - Ana Paula Lisboa

Hoje sonhei e
Isso não é novidade.
Na quimera a gente dançava...
E havia beijos e alegria.
Como se isso fosse novidade.
Mas a gente descordava,
Brigava, eu me revoltava
E eu corria mundo a fora.
Saia correndo de um bar
E entrava em uma farmácia
Para comprar um Dorflex.
Isso também não é novidade.
Incontida como sempre eu te ligava
Para contar que estava nevando,
E isso sim era novidade, pois
Eu nunca vi a neve.
Nem em sonho...
Então eu lembrava que não
Estava falando com você
E desligava o telefone na sua cara.
É novidade eu ser mal educada.
E me apareciam monstros na sala
De casa.
Uma casa que só era minha
No sonho.
Negros e famintos!
Vampiros é claro, meus maiores
Amores.
É novidade eles serem do mal
nos meus sonhos.
Eu conseguia matar um deles,
Cinematograficamente,
Com a ajuda de uma garota
Que apareceu no sonho eu sei
Lá por que.
Mas um deles continuava vivo
E nos perseguia pela rua.
Não é novidade eu sentir frio na
Espinha.
E depois de muito correr ele
Nos encurralava em um beco,
E quando eu achava que tudo
Já estava perdido...
Eu acordei...
Acordei achando que tudo isso é
um sonho.
Quanto tempo durou?
Os sonhos são infinitos!

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Domingo - Ana Paula Lisboa

Ontem aconteceu
E eu não pude fazer nada.
Não pude falar nada.
Foi do nada.
Havia tempo não acontecia.
Havia tempo não era tão forte.
E foi inesperado.
O dia foi comum,
Como todos os outros domingos.
E eu acordei pensando
Que tudo estava bem,
Ninguém me avisou.
Eu até cantei pela manhã...
Estava tudo certo,
Pelo menos era o que eu pensava.
Foi à noite.
Veio rápido e sorrateiro.
Eu tive vontade de gritar,
Mas já era tarde, e eu não
Queria incomodar ninguém.
Veio também a vontade de
Sair correndo, mas era tarde,
E eu não queria me incomodar.
E se eu ligasse?
Não.
Amanhã é segunda, as pessoas
Dormem cedo.
Ainda assim eu liguei,
Mas ninguém atendeu...
Já é tarde!
Eu voltei pra cama e foi aí
Que tudo aconteceu de verdade.
Eu- tive- medo-eu chorei- de- medo-
De- pavor- eu- temi- muito- eu- quis-
Sumir- cortar- os- pulsos- me-
Afogar- no- chuveiro- pegar- chuva-
Pra- ter- pneumonia- deixar- um- cão-
Com- raiva- me- morder- comprar-
Uma- aranha- venenosa- enfiar- os-
Dedos- na- tomada- ligar- o gás- do-
Forno- e – enfiar- a- cabeça- viajar-
Ilegal- para- os- EUA- comer- mocotó-
Com- feijoada- junto- com- buchada-
De- bode- elogiar- o – W- Bush-
No- Afeganistão- mediar- a- paz-
No- Oriente- Médio- subir- o morro-
Dos- macacos- de- vermelho.
UFA!!!
Mas agora já está tudo bem...

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Monólogo - Ana Paula Lisboa

Que Fé é essa de que tanto falas?
Que Amor é esse que tanto indagas?
Que sentimentos sublimes são esses que tanto persegues,
Não somente tu, mas toda a Humanidade?
Pessimista estou, não sou, ,mas estou!

Me fale mais sobre as flores...
Elas cheiram bem?
Que gosto tem?
Você as tocou?

A minha Fé foi abalada,
E não por tua causa,
Quase extirpada, escassa.
Mas eu ainda me lembro.
Eu ainda estou aqui e Ele sempre está lá.
Lá não, aqui.

Perdão requer arrependimento e
Eu ainda não me arrependo.
Ainda.
Ele sabe de tudo mesmo,
De tudo o que se passa.
E só por lembrar disso a
Minha Fé não se acaba.

Poderão um dia viver em
União almas distintas?
Católicos e Protestantes?
Negros e Brancos?
Injustos e Justos?

Eu vivo junto dos poucos
Que me são iguais.
Contudo os diferentes me encantam,
Me apaixonam e me chamam
Para morar com eles.

E aí eu fico assim...
Um pé lá e outro cá...
Que nem biscoito meio a meio.
Recheada de Desejos e de Memórias.
Com os pés nas nuvens,
E a cabeça presa ao chão!

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Construindo - Ana Paula Lisboa

Elas não me deixam ter paz.
As Palavras não param de chegar.
De olhos fechados ou abertos.
Dormindo ou sonâmbula.
Em pé e também sentada.
Na aula ou tomando banho.
Elas vêm. De todos os lados.
Por todos os lábios.
E falam alto, bem aqui dentro.
Estão conectadas diretamente a minha
Mão direita, Palavra.
Procura a caneta e o papel com
Uma rapidez espantosa.
E ai de mim se eles não estiverem por perto!
Elas se revoltam, gritam cada
Vez mais alto, e
Não param até que seu desejo
Seja satisfeito.
E eu as fico admirando,
Babando pela coreografia no papel,
Contemporânea.
De vez em quando uma ou outra se destaca.
Eu dou lugar e ela faz um solo.
Vira a primeira bailarina.
Minhas palavras não sabem cantar.
Eu invejo quem sabe fazer palavra
Virar musica.
Mas elas dançam bonito, não
Me deixam envergonhada.
Eu amo minhas palavras, apesar de odiá-las.

Cômico - Ana Paula Lisboa

Você tá falando de mim?
Tu tá falando comigo?
Se tá então me avisa por que eu tô confusa.
Eu falo.
Você responde?
Que antonímia é essa?
Põem um sinal,
Desenha uma estrelinha
Quando for minha vez de ouvir.
Eu tô confusa.
Já sou morosa e isso só piora.
Eu devo responder agora?
Você quer que eu cale a boca?
Quer que eu escreva seu nome no verso?
Algo que rime com Aves?
Algo que rime com Bobo?
Ou algo que rime com Som?
Peraí.
Se o problema é esse tu pode escrever o meu.
Eu não ligo não.
Mas só tente arrumar uma rima bonita pra mim.
Ou põem as inicias:
A P L.
Amor Platônico Liberalista.
Tô zoando...
(risadas)
Eu sei que tu não tá falando comigo.
Né?
Deve tá falando com alguma loira por aí.
Eu não queria mesmo...
(beicinho e balançar de ombros típicos de criança ciumenta)
Valeu a brincadeira.
Inté terça feira!

terça-feira, 4 de maio de 2010

Que maravilha! - Ana Paula Lisboa

Que maravilha!
Agora eu sei por que a lua está tão grande,
É para disfarçar a noite sem igual.

Agora eu vejo as noites de forma diferente.
Agora eu olho o futuro como o meu presente.

Agora eu sei por que escrevo.
Para ser feliz.
Agora eu sei por que me apaixono.
Para escrever.

Agora eu sou doida pela noite.
E a noite ninguém pode me roubar.
A noite é minha...
Já me levaram o Sol. Já basta!

Thank you for the oppen door.
Obrigada por que não sou mais só.

Agora eu posso dormir sossegada.
Agora eu posso dormir descansada.
Por que o amanhã é bom!

As borboletas ainda estão aqui,
E vão continuar para sempre.
Eu continuo sonhando contigo,
Mas agora é diferente.

Que maravilha!

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Tatuagem - Ana Paula Lisboa

Tatuagem é coisa que só dá em ser humano.
Tatuagem não dá em bicho.
Mas tem gente que desenha animal,
Tem gente que desenha gente
E escreve nome de pessoa.
Eu escrevi o que me é importante,
Escrevi para não esquecer mais.
A dor foi complemento do
Prazer de ver o vazio ficando cheio,
O nada virando alguma coisa.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Do Mal - Ana Paula Lisboa

Agora deixe-me falar um pouco.
Devo confessar meu pecado.
Eu não sou boa pessoa.
Sou do lado negro da força.
Eu sei, isso é feio, mas não consigo evitar.
Eu uso as pessoas.
Uso pessoas para escrever,
Uso pessoas para ler,
Uso pessoas para me ouvir.
Algumas pessoas, bem específicas, eu uso
Pra me fazer feliz.
Também uso pessoas para me deixarem acordada e
Outras para não me deixarem dormir.
Eu finjo e interpreto vários personagens.
Sou boa nisso, vivo um personagem há 22 anos.
E muita gente acredita...
Às vezes eu sou a Aninha, boazinha, compreensiva,
Quase uma princesinha.
Tem gente que me chama de Paulinha, uma gracinha de menina.
Eu gosto de ser a Ana, amiga, sensível, segura de si e muito feliz...
A Kátia, minha progenitora, me chama de Ana Paula...só ela me conhece...
Eu sou do mal.
Pareço simples...mas a complexidade é meu segundo nome, na verdade o terceiro.
Uma pessoa com dois nomes não pode ser simples,
Desde que aprendi a escrevê-lo fiquei confusa.
Qual meu nome de verdade?
Esse negocio de nome composto só serve para complicar.
Fico sem saber quem sou, me chamam de vários nomes,
Às vezes sobrenomes, as vezes Antonia...
Antonia eu adoro, mais um personagem na galeria.
Mas do mal sou eu...a Antonia é do bem.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Palavra - Ana Paula Lisboa

Escrevi no corpo quanto a amo.
Cravei na pele a minha paixão.
Gravei a fogo a fome e a vontade,
O desejo e o tesão,
A alegria e a angústia.
Ela me possui...
Meu substantivo feminino
Favorito, predileto e preferido.
Agora sou completamente dela...
Está consumado, não posso voltar,
E nem quero!
Assim como nada, não me arrependo.
Nem do choro,
Dos encontros,
Do beijo,
Da tatuagem...
Eu a beijei, e foi de língua.
Eu devia me arrepender?
Desculpe, não consigo,
Foi tão bom...
E a dor deu um gosto
Mais especial.
Não foi da PALAVRA
Foi no beijo, do toque no corpo,
Da possessão entre duas
Figuras femininas

terça-feira, 27 de abril de 2010

Poesia - Ana Paula Lisboa

Ele ficou louco quando me viu.
Assim, boquiaberto, de quatro,
Sem nexo, sem lenço e
Sem documentos.
Ficou encantado...
Babou pelo meu rebolado e
Veio logo cheio de dedos.

Prostrou-se bem embaixo
Da minha janela.
Me fez serenatas cantando
Melodias sem igual, que
Ele mesmo escreveu pra mim.

Feito um bebê faminto
Chorava implorando que eu
O deixasse meus lábios tocar.
Mas eu dizia que não.
Que moça direita não faz
Dessas coisas.
Que moça donzela e mulata
Não pode ficar mal falada.

Um dia sem avisar, para que
Sua esperança não fosse em vão,
Dei a ele minha mão, para
Que pudesse segurar.
Um arrepio tamanho me
Percorreu o corpo, um sabe
Lá o que me arrepiou a espinha
E uma escola de samba
Tocou no meu peito.

E aí eu comecei a dançar sem musica,
Passei a escrever poesia.
E agora eu cantava alto
Pro mundo musicas
Que antes eu nem conhecia.

Papai diz que não.
Que filha dele não casa com artista,
Que nasci para moço de vista e
A mãe diz que homem branco
Não traz euforia.

Eu fugi.
Fugi porque é melhor ser
Negra fugida do que ser
Negra triste.
Fugi porque a Paixão
É a melhor coisa que existe.

E um dia alguém vai contar
Nossa história. Ou que
Fique mesmo só na nossa memória
Uma antropofagia diária cheia vaidade.
E eu me ufano da urgência de te perguntar
Todos os dias se me amas de verdade.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Muito Falada - Ana Paula Lisboa

Eu falo demais.
Só falo o que não devo,
O que não presta,
O que não seve.
E falo coisas sinistras
Até sem abrir a boca.
É só me olhar e a pessoa
Logo vê que não penso
Coisas boas.
E quando abro a boca
Só me comprometo.
Só sai coisa sem valor,
Tolice, sem jeito.
Minha fala é sem modos,
Desagradável, patética.
Desmate, sinistra,
Bestice e sem ética.
Cortarei fora a língua,
Que é a língua que me condena.
Vou costurar os lábios
Com linha de aço e sem pena.
Com a língua farei sopa,
Que tudo nessa vida
Se aproveita.
Uma sopa dislexa,
Insossa, que ninguém aceita.

Quando eu resolvo escrever- Ana Paula Lisboa

Estive pensando em parar de escrever. Não que eu ache isso algo possível, mas escrever tem me trazido muitos efeitos colaterais.
Meus dentes se trancam, minha testa franze, mordo os lábios, a cabeça dói e a insônia, antes inexistente, tem se tornado constante. As noites não são mais como antes.
E penso se vale a pena tudo isso...de que adiante para os outros querer me entender, me decifrar?
E depois que eu morrer vai ser pior: vão criar varias teorias psicológicas, vão encontrar motivos, levantar suspeitas e vão escrever criticas.
Que pretensão a minha...dá até vontade de rir... Ninguém vai ler. Eu mesma daqui a algum tempo vou odiar tudo isso.
Deixo claro que não escrevo para ser entendida, sou mulher e isso para mim é algo ininteligível.
Escrever não me traz sono e não e deixa tranqüila. Escrever me traz agonia, inquietude, devaneio e dor de barriga.
Eu só escrevo porque não sei falar. Nasci muda para coisas inimagináveis.
E às vezes eu falo porque ainda não aprendi a escrever. Quem sabe um dia.
Escrevo mentiras que são verdadeiras e verdades que não passam de mentiras.E não vai adiantar perguntar o que é o que, eu não vou dizer. Só tenho um cúmplice nessa vida. Ele me disse que assumiria o risco até o ultimo suspiro do segredo.
E ainda que eu te contasse teria que matá-lo depois,ou antes, suicídios seriam cometidos. Não agüentariam o peso de guardar meus segredos, minhas mentiras e minhas verdades, meus medos, minhas dores, meus amores e meu desejos. Segurar minhas alegrias gigantescas e os dias de carência aguda. Escolhi pessoas a dedo paras esses momentos. Mas escrever eu escrevo para todo o mundo. Culpa daquele menino mal humorado que só me encoraja a fazer besteira. Umas delas é escrever.
Um dia eu venço essa fome, esse desejo incontrolável de falar o que não devo. Aí eu paro. Duvido.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Típico - Ana Paula Lisboa

Ouvi uma conversa estranha.
Típica de amantes dissimulados.
Típica de gente que não vale o prato que come.

Pesquei no ar...
Falavam de coisas loucas,de remédios,
De papeis, de suco.
E gargalhavam alto.
Principalmente ela.

Estava na cara o desejo de
Rasgar a roupa um do outro.
Dava pra ver nos olhos o
Desejo de orgasmos múltiplos.

E eles me deram nojo,
Me deram raiva, repulsa.
O cabelo escovado, o perfume caro,
Seções de beleza,
Nada disso lhe serve.

Olha lá, estão saindo...
Dissimulados!
E ela foi quem chamou.
Dissimulada!
Posso ouvir os gemidos daqui.

Olhos Azuis- Ana Paula Lisboa

Entrou, passou a roleta e eu fui obrigada a reparar.
Uma pele alva, uns olhos azul piscina.
Deve ser o calor.

Tirou a carteira do bolso e eu fui obrigada a reparar.
Reparei num cabelo bem preto.
Que contraste...
Reparei numa carteira marrom em sua mão.
Que contraste...

Braços peludos, camisa cinza, calça jeans, tênis.

Um olhar sem jeito.

O olhar fofocou o livro da pessoa ao lado,
Depois o olhar voltou-se para a janela.
Ele admirava o mar, montanhas verdes
E a Lagoa vista do Cristo.

Aí eu fui olhar...e só vi barracos...
Deve ser por causa dos olhos,
Fui obrigada a reparar.
Todo horizonte dele deve parecer o mar.

E eu fui navegando,
Viajando em um mar de possibilidades.
E eu não pude deixar de reparar que
Ele reparou na mulher que saltou.
Foi bobo. Ficou vermelho.
E eu levei um caixote.

Como nasce o sol- Ana Paula Lisboa

O sol nasce de manhã,
Lá por umas 5:30.
Tudo começa bem devagar.
Primeiro ele é azul, depois fica rosa e aí fica laranja.
O sol não nasce todo de uma vez, ele não rompe a manhã.
O sol é um cavalheiro.
Ele chega de mansinho, como um samba canção,
Pedindo quase licença.
Te faz um chamego, um cafuné.
A noite nem sente, quando vê já foi tomada.

Vi o sol nascer pela primeira vez.
Perdi outras 8030 vezes em 22 anos.
Ai se eu soubesse...

Imagine o primeiro nascer do sol, no Éden.
A terra era sem forma e vazia
E só havia trevas sobre o abismo.
Até que Ele fez a luz.
Viu que a luz era boa.
Mas Deus não faz nada que não seja bom...
Chamou a luz de dia.
Chamou as trevas de noite.
Mas aí...o próximo passo foi separar o dia e a noite.


Consegui o impossível.
Eu vi o dia e a noite, separados
Desde a criação, unidos.
Rompi a barreira do tempo e do espaço.
Eu era metade noite 20 e metade manhã 21.
Uma metade era eu a outra metade era ele.

Adão foi homem sortudo.
Viu o nascer do sol em um horizonte
Bem mais limpo que o meu.
O meu horizonte tinha prédio, tinha casa, tinha sobrado...
...e tinha ele...

Escrita louca essa minha.
Deve ser o sono que já me toma o corpo e a alma.
Mas o inacreditável daquele momento foi tamanho,
Que eu precisava te contar.

Descoberta- Ana Paula Lisboa

Descobri quando foi.
Foi no dia em que descobrimos que
Os dois conheciam a dupla e o Seu Nelson.

Foi no dia em que você me ligou de manhã cedo
Ou no que eu te liguei desesperada.

Foi na primeira vez que li seus versos.
Sim, foi naquele dia.

Foi no dia em que eu quis ficar mais um pouco
Ou no que eu quis sair correndo.

Acho que foi na primeira vez que descordamos
e realmente isso me pareceu importante.

Foi quando eu achei você estranho e
Comecei a reparar em pequenos detalhes.

Foi no dia em que eu não parei de falar
Ou no dia em que eu não sabia o que dizer.

Ah, claro!
Foi no dia em que o coração disparou com “CA-HAM”.

Foi quando eu gostei de ser chamada pelo apelido
Ou quando eu adorei o seu.

Foi quando eu passei a ter que ouvir aquela
música todos os dias.

Foi quando eu reparei que em dias específicos da semana,
As tardes eram mais tristes pra mim.
E em dias, também específicos, eu
Ficava mais ansiosa que o normal.

Foi no dia em que eu quis escrever
Ou na vez em que eu quis parar de escrever.

Será que foi no dia da batida de carro?
Não, não, isso foi antes.
Mas foi engraçado.

Já sei.
Foi no dia em que você me contou suas mazelas.
Não, também não.
Nesse dia eu só fiquei curiosa.
Então foi na vez em que te dei um susto. No ônibus, lembra?
Ou não foi essa vez? Acho que já tinha acontecido antes disso.

Foi quando você me chamou de nuvem, obvio.
Não, foi no dia das revelações, do primeiro
Guardanapo escrito.

Foi no dia em que senti frio?

Mas espere...será que foi só hoje?
Mas eu podia jurar que havia descoberto,
E só por isso resolvi escrever.
Mas agora, escrevendo, desaprendi tudo de novo.

Sei lá.
Vai ver foi tão rápido que não deu tempo da mente registrar.

terça-feira, 20 de abril de 2010

Poema da falta de luz- Ana Paula Lisboa

À noite todo os gatos são pardos.
Quem me dera...
A noite é dos amantes.
Quem me dera...
A noite é dos bêbados.
Quem dera...

O escuro me pertence, me persegue,
Me acompanha.
O escuro está sempre próximo a mim.

Que farei, pois, no escuro?
Escreverei, ora essa...
Escreverei a luz de velas
Como os companheiros de outrora.

A luz se foi, mas deixou estrelas.
Quem falou que podia ouvir estrelas?
Um louco apaixonado, por certo.
E eu as fico mirando, esperando que
Digam algo.
Cruzeiro do Sul, me mostre o caminho!

Vou acabar cansando e dormindo.
A vela vai cair, vai queimar o colchão,
Vai queimar a casa toda.
Desculpe, escapou. Falei demais...

Tudo bem...
A noite nunca dura para sempre e
A falta de luz também não.
Basta de noites escuras, basta de Lobos.

Poema para quando a luz voltou- Ana Paula Lisboa

Eu não vou para a luz.
Eu prefiro continuar com as luzes apagadas.
Eu prefiro acreditar que nada aconteceu.
Eu prefiro a companhia da vela.
Eu escolho continuar a ver mais estrelas que o normal.
Por que estão gritando?
Meu Deus, isso foi um rojão?
Eu escolho a emoção das formas retorcidas, da
Penumbra, do olhar mais atento ao chão.
Eu escolho o não saber o que se pode encontrar.
Eu prefiro a pupila dilatada.
Eu prefiro o escuro, eu prefiro o negro.
Eu prefiro o risco de ter uma vela em cima da cama.
Eu gosto do bicho papão

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Copos - Ana Paula Lisboa

Sim, copos se quebram. Ouvi isso hoje de um amigo e só agora atinei. É verdade, meu Deus, copos se quebram.
Quando criança quebrei vários copos, sempre os preferidos de minha mãe. Ela viu durante os anos a louça que ganhou de casamento ser quebrada pelo três filhos. Será que minha mãe ficou triste alguma vez? Claro que ela reclamava, brigava, me chamava de relaxada, desleixada... mas nunca a vi chorar por um copo quebrado. Minha mãe, em sua imensa sabedoria, já sabia o que só aprendi hoje: copos não duram para sempre.
Não adianta, por mais cuidado que tenhamos ao lavá-los ou guardá-los, um belo dia eles escapam de nossas mãos e a Lei da Gravidade vence. E não adianta querer esconder os cacos, dizer que não viu o copo, minha mãe sempre sentia falta e via nos meus olhos o que eu tentava disfarçar.
Mas existe uma chance. Minha bisavó, que por sinal ainda está viva, tinha duas cristaleiras em casa. Os copos eram lindos, reluzentes... e o espelho que ficava ao fundo do móvel fazia com que eles brilhassem ainda mais. Os copos mais lindos que já vi. A cristaleira ficava trancada a chave e a chave ficava trancada no guarda roupas dela. Mas para que tanto cuidado com algo que foi feito para quebrar? Minha bisavó tem uns 95 anos e aqueles copos tem pelo menos a metade da idade dela. Essa é a forma para os copos não se quebrarem nunca, é só não usá-los nunca. Fácil assim.
Cristaleira é móvel que nunca terei. Quero usar meus copos, quero usá-los muito. Quero quebrá-los por acaso, no susto e também quando der vontade. Se os gregos quebram pratos eu posso muito bem quebrar copos.
Minha mãe, sabia como sempre, depois que minha terceira irmã nasceu, cansou de ter copos quebrados, agora é tudo de plástico. Copos de plástico, pratos de plástico. Felizes são os talheres! Eles não se quebram fácil, podem ser usados sem medo.
O coração é como um copo de vidro. Perdoe-me, não queria induzi-lo a fazer analogias, ou metáforas, ou comparações. Mas precisava dizer só isso. Use seu copo. Pode ser com um suco de manga, champanhe, caipirinha ou uma água gelada num dia quente. Use seu copo, não o deixe numa cristaleira, não o venda para um antiquário. Quando minha bisavó mudou-se para uma casa menor não pode levá-los e eu nem sei o que foi feito daqueles copos lindos, mas nunca usados.
E se ele um dia quebrar não tente esconder os cacos ou disfarçar. Sempre há alguém que percebe, dá falta do copo. Esse amigo de hoje encontrou meus cacos no lixo, e nem precisou me olhar nos olhos. E foi tão gostoso quando eu pude confessar a ele: “ Amigo, quebrei meu copo.” Aí ele me pegou pela mão, me levou pra almoçar e me deu, sem que eu pedisse, um copo novo.

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Velha - Ana Paula Lisboa

Eu estou velha
Demais para brincar
De bonecas.
Estou velha o
Suficiente para aprender
A andar de bicicleta.

Já está na hora da
Nostalgia chegar.
De pensar nas historias
Que contarei para
Os meus netos.
E talvez não sejam muitas,
É muito melhor contar
As mesmas todos os
Dias, em tons diferentes.

Não sou mais nenhuma
Adolescente para ter rompantes
Apaixonescos e ligar para os outros
De madrugada.
Sentir o coração saindo pela boca,
Só de ver o querido.
Isso é coisa de jovem...

Alias, sou uma senhora.
Uma senhora caquética,
Cheia de rugas, sem
Dentes, quase calva.

Vou contar minhas histórias
Da juventude.
As loucuras que fiz e as
Que queria ter feito.
Darei conselhos.
Saberei distinguir o bom
E o ruim, o certo e
O errado. E os mais novos
Me ouvirão, talvez aprendam
Talvez não.
Mas os mais velhos sempre
Tem razão.

E vou parar de ter picos
Hormonais que recarregariam
Celulares.
Vou ficar calma, serena.
Farei crochê na varanda
Me balançando em uma cadeira.

Lembrarei com saudades da dança,
Dos amigos, dos filmes,
Dos professores.

Chorarei pelos sonhos
Nunca realizados e me
Alegrarei com certeza,
Por que viver já é um sonho.

E vou ter varias estantes
De livros.
Quem sabe algum com
Meu nome na capa.
Vou reler os que leio hoje
E vou achá-los diferentes.
Vou me ver outra pessoa.

E vou morar onde eu
Possa ver mais estrelas
Que luzes e a lua cheia pareça
Um farol e nas manhãs eu ouça
As folhas caírem ao chão.
Talvez eu viva sozinha lá, eu
E minhas lembranças.

Deixa - Ana Paula Lisboa

Não fale nada, por favor.
Deixe tudo assim, do jeito que está.
Me deixe ficar com as impressões do hoje.
Com cada palavra, com cada gesto,
Com cada trova.
Com aquela pinta nova que encontrei...
Com cada história que nunca imaginei...

Deixe que eu saboreie um pouco
Mais antes de despertar.
Deixe eu ouvir o eco da sua voz nos meu ouvido
Um pouco mais antes do barulho voltar.

Por favor, não me deixe acordar.
Me deixe ficar assim... no ar...
Não deixe o amanhã chegar, não deixe
A hora passar, por favor, não deixe
O ... acabar.
Eu imploro,
Não deixe a condução me levar.

Me faça parar de falar, me beije logo.
Me esquente. Me olhe nos olhos.
Tudo bem então, mas segure pelo menos minha mão.

Por favor, não tenha vergonha.
Eu estou aqui, não estou?
E amanhã quando o sol voltar eu
Vou estar lá, no mesmo lugar,
Esperando só por esperar.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Parada - Ana Paula Lisboa

Quero parar de escrever.
Quero parar de sentir o coração apertado.
Quero parar de sair de casaco.
Quero parar de acordar de madrugada
com a sua musica na cabeça, antes que eu enlouqueça.

Quero parar de fazer sem querer.
Quero parar de fazer o que eu não gosto.
Quero parar de fazer só por que você quer.
Quero parar de fazer só por fazer.

Quero parar de ter sonhos estranhos.
Quero parar de ter dor de cabeça,
Parar de tomar remédio.
Quero parar de esquecer de tomar o remédio.

Quero parar de ouvir musica em inglês.
Quero parar de assistir aulas chatas.

Quero parar de ver o sol através do insufilme,
Parar de sentir frio, parar de rir do seu riso.

Quero parar de não ter tempo para ler Freud,
Para ler Machado, para ler Adélia, para ler a Bíblia.
Para ler a mim.

Quero parar de usar sapato apertado,
Parar de ter calos, de ter bolhas, de engolir sapos.
Quero parar de ficar calada pensando e parar
De falar sem pensar.
Quero parar de te perturbar, de te ligar e de
esperar só por esperar.

Quero parar de dormir.
Quero parar de comer.
Quero parar de em papeis soltos escrever.

Quero parar de usar esse sibilar só
Pra cariocar e o sotaque carregar.

Quero parar de mentir,
Principalmente pra mim.
Quero parar de ser chata e exigente,
Principalmente comigo.
Quero parar de escrever fora da norma,
De escrever fora do clima,
de inventar rimas desconhecidas.

Ajeitado - Ana Paula Lisboa

Terceiro sinal.
Luz vermelhoalaranjado.
Uma caneta Bic que fala e toca violão.
Ele não está a fim de aquecer, nem nada.
Choro antes, choro depois.
Falta de ar...balões de oxigênio.

E eu seguro minha mão na sua, pela primeira vez,
Como se fosse a ultima, como se fosse a nossa vez.
Mas você é tão frio e o seu gelado é o que mais
Me arrepia...é o nosso ultimo dia aqui nas nuvens,
Nuvens brancas que cheiram a fumaça...

Parar de escrever pra que?
Planos para o futuro que é hoje.
Covarde aqui nós num conhece.
Agora é quase a hora.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Viciada - Ana Paula Lisboa

Eu estava esperando por isso.
Eu desejava isso há meses, talvez anos.
Eu queria que acontecesse.

Eu queria ter motivos.
Eu quis ter vontade.
Na verdade eu procurei, desculpe,
A culpa é toda minha.
Eu quis muito antes de você.

E agora eu quero mais.
Viciada.
E com o tempo eu vou precisar
de doses maiores, mais potentes.
Será que você vai querer também?

Se você quiser eu dou.
Dou sim.
Mas é melhor não,
Você pode viciar também

Resposta - Ana Paula Lisboa

Quem me dera poder responder a
Altura do som que mereces.
Mas não teriam vozes suficientes no mundo.
Não poderia atinar vocábulo em qualquer língua existente.
E tão pouco o uivo mais triste de um lobo sem matilha
Descreveria minha humilde resposta.

Queria escrever-te um poema parnasiano, onde
A forma importa bem mais que o pranto.
Mas o teu querer me encanta mais que tua forma.

Quem sabe um soneto escrever-te?
Não, sonetos são de amor.
Não posso atrever-me a declarar que amo,
Seria muito para mim e para vossa mercê.
Mas amo o que escreves.
Amo a sutileza do que leio com o coração na boca.
Uma vez logo pela manhã, e depois milhares de vezes
Durante vários dias.

Caríssimo, se é que posso assim chamar-te,
Não negue-me nada, não mate-me nada.
Nossa forma é clara.
Implicante e dissimulada.
Dialógica.

Pois só escrevo por que me mandas.
Somente sonho, pois ouço
Tua voz todas as noites.
Viciei-me em ti.
Oh, meu Deus! O que digo?!
Declarei-me a ti?
Disse a ti o quanto desejo-te?
Louca que sou...
Perdoe-me se bebo, se enlouqueço...

Mas ainda assim minha resposta
É curva e insegura.
E não se compara ao tamanho dos teus versos para mim.

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Bêbada - Ana Paula Lisboa

Vou perguntar uma só vez e vou querer uma resposta rápida.
Gritada bem alta.
Se gritarem eu vou gritar junto.
Gritar que odeio momentos especiais.
Odeio pizza...
Odeio a vontade que eu sinto de te beijar...
Odeio você fingir que não sabe...

Vou gritar também que nada é perfeito.
Que o mundo é uma droga
E que esse lugar é um outro mundo.
Me irrita sentir fome...
Me irrita você olhar assim pra mim...
Mas o que mais me irrita é essa fome de escrever
E não encontrar palavras.

É só conseguir dizer versos toscos,
Medrosos, escusos, sem nexo.
Pouco acadêmicos e
Pouco inteligentes.
Escritos na mesa de um bar

Dia VI - Ana Paula Lisboa

Foi como se fosse a primeira vez.
Não, foi muito melhor que da primeira vez.
Foi muito mais feliz,
Foi muito mais olho no olho, foi com muito mais propriedade.

Ali, hoje, eu não era mais eu. Eu era ela, e
Ela era eu, ainda que nós fossemos tão diferentes.
Ela da roça.
Eu da cidade.
Ela teve cinco.
Eu só quero ter um.

Mas agora não existo mais eu.
Agora somos nós. Foi por osmose.
Agora meu nome é o nome dela.
Eu não a escrevi,
Ela me escreveu de novo.

Dia V - Ana Paula Lisboa

Pessoas e momentos especiais.
Platéia linda, flashes e gritos.
Sorrisos, muitos sorrisos.
E uma alegria pela morte sem tamanho.

Claro que bate a melancolia
De ser o penúltimo dia,
Ainda mais em quem adora uma melancolia.

Mais a alegria, como devera de ser, permanece
Maior.
Hoje é dia de folia.
Depois se pensa na quarta-feira de cinzas.

Dia IV - Ana Paula Lisboa

Felicidade de borboletas.
Aquelas que voam de flor em flor. Presença de todos os dias.
Mas com cores diferentes, com olhos diferentes.
E com gargalhadas diferentes.

Conversas loucas e gargalhadas sem motivos.
O melhor é que tudo terminou bem.
Apesar da morte, apesar das águas
Todos vieram me ver.
Até os que não conheço.

Massagem nas costas,
Remédio pra dor de cabeça,
Choros e velas.

Assegurar-se até onde se pode e
Se brilha mesmo assim.
Existe somente a coreografia certa pra hoje.
Tremer no palco...
Transformar falta de equilíbrio em salto.Vamos... é hora

Dia III - Ana Paula Lisboa

E mais um dia e todos os dias
E mais um dia.


Ouvi um “Que isso?!”
Uh...Hu...lindona, gostosa,
Incrível... só imaginei.
Um dia de ceia, um dia de Páscoa.

Um dia de forró juntinho antes das 20:30.
De espera por aquele momento
Em que a gente se encontra no
Nosso cantinho mágico em meio
A nuvens e a escuridão.

Dia II - Ana Paula Lisboa

Revelam destinos e felicidades
Com o fio da vida cheio
De privilégios. Cheios de tudo
E todos cheios do mundo.

Dias todos iguais lindos,
Lindos...
Expressões de felicidade
De gente linda e perfeito.
Sem erros, suaves como fumaça.

E a musica era forte, gritante
Que me fazia sorrir.
E cada pessoa que chegava
Me fazia ainda mais feliz.
E no fim palmas, só plamas.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Dia I - Ana Paula Lisboa

Se as coisas falassem por mim,
Se as pessoas falassem de mim,
Se meus amigos soubessem de mim.
Diriam que sou fraca,
Diriam que sou má,
Diriam que sou feia.
Diriam que é melhor que eu morra.
Não teriam nenhuma esperança,
Não sentiriam nenhum carinho,
Não choraria com a que chora.
Diriam que sou fria, que sou psicótica,
Calculista, que não presto pra nada,
Que não sirvo pra nada.
E todos ririam de mim.
Ririam do meu sentimentalismo, da
Minha voz esganiçada, de meu
Nariz de negro, das
Minhas celulites.
Ririam de eu existir, de eu ter nascido.
Ririam principalmente das coisas que
Escrevo.
E eu adoraria.

quarta-feira, 31 de março de 2010

Fazer - Ana Paula Lisboa

HOJE VOLTEI A CANTAR
CANTO BAIXINHO
CANTO POQUINHO
CANTO SAUDADE
CANTO AMOR

NÃO SEI CANTAR

MAS CANTANDO...

EU SEI QUE VOU TE AMAR
NO PEITO DOS DESAFINADOS TAMBÉM BATE UM CORAÇÃO

EU SEI EU CANTO SÒ PRA MIM
SÓ PRA EU OUVIR

EU, O COMPUTADOR, A MESA
O RED FONE
A CALCULADORA
O GRAMPEADOR
AS CANETAS
A CANETA AZUL
A FAMOSA CANETA AZUL

MEU PUBLICO É VASTO
MEUS OUVINTES SÃO MUITOS

MEUS FÃS ME AMAM
E EU NÃO OS ODEIO MUITO
SÃO ELES QUE ME DÃO O PÃO.

QUERO PARAR DE CANTAR
TENHO MAIS O QUE FAZER.

Desejo... - Ana Paula Lisboa

Desejo, palavra, beleza, memória e fé.

ME DA UMA VONTADE, UM APERTO
TENHO TIDO MUITOS APERTOS ULTIMAMENTE.

TUDO ME APERTA.
SERÁ QUE EXPANDI?
MAS PRA ONDE, TEM DIA QUE ME SINTO TÃO PEQUENA.

E OS DIAS...

DESOBRI HOJE QUE AO INVÉS DE LAMENTAR TEM QUE SER DIFERENTE, DIFERENTE MUITO.

QUE VONTADE!
QUE DESEJO!
QUE FOME!

COMER, COMER:É O MELHOR PARA PODER CRESCER

BRANCO... - Ana Paula Lisboa

Branco.
Se tudo fosse branco,
Claro, nevado.
Leve e magro.
Forte. Traços.
Só por fora e por dentro.
Por dentro é leve,
É branco de magros
Traços.
É indecifrável e se faz presente.
Um presente.
Presente do Pretérito,
Mais que imperfeito.
Duplicador de imperfeições,
Multiplicador de curiosas delícias.
Delícias cor de bolo.
Bolo de noiva,
Branco, leve e nevado.
Cheiro de surpresa no ar.
Cheira a musica, musica branca.
Rebelde musica que enche os olhos,
Enche o peito e enche os ouvidos.
Curiosas e deliciosas imperfeições humanas.

Ana Paula Lisboa

terça-feira, 23 de março de 2010

Nunca mais - Ana Paula Lisboa

Véspera
Vespertino
Inesperado
Morrer de véspera, tipo peru.

É amanhã que tudo acontece...

To com raiva, raiva de continuar vivendo e esperando.
Esperar
Espera constante que nunca se acaba, nunca termina, nunca se cansa.
Só espera.
Pior esperar o que nem se sabe o que é.
Vou parar de escrever.
Nunca mais!

Som de Chuva - Ana Paula Lisboa

Chuva faz barulho, chuva faz sinal.
Sol e chuva: casamento de viúva.
É morreu mesmo.
Morreu pra sempre?
Que saudade, que nó no peito...
Por que algumas pessoas fazem isso na gente?
Uma imagem já trás felicidade.
E trás desejo, que desejo eu desejo.
Borboletas no estomago, sejam bem-vindas de volta.
Quero vocês pra sempre em mim

Renda - Ana Paula Lisboa e Eliza Moreno

Entremeio Maria Morena do coração desencontrado.
Ponta luz do dia:
Pontilha florada,
Bico das margaridas.
Renda céu estrelado,
Renda esganada,
Renda bicuda.
Bico de rainha.
Bico de abandono.
Renda água de pote,
Renda estrada de ferro,
Renda tramóia.
Entremeio do coqueiro:
Entremeio da pestana,
Bico da jibóia.
Entremeio do sabão:
Bico da aliança,
Bico de pé de coelho.
Aplicação do camarão:
Aplicação do abacaxi,
Renda de coentro.
Entremeio Maria Morena do coração desencontrado.

O Fio - Ana Paula Lisboa e Eliza Moreno

O fio. O fio colorido. O fio grosso. O fio leve.
O fio fino. Um fio.
Apenas um.
Um que fosse fio semeado.
Que tivesse cheiro de chão.
Um fio zelado.
Porque tem que zelar.
Zelar do sol. Zelar da chuva. Zelar da terra.
Zelar de bicho. Zelar de gente. Zelar de si.
E aí eu colhi. Colhi com a mão.
E enquanto desencaroçava desconhecia-me,
me livrava de quem poderia ser,
pois podia ser milhares de outras coisas.
Um fio que faz tapete é o mesmo que faz cobertor?
Si ni um a gente pisa, si ni outro a gente deita.
Si ni um a gente bate, si ni outro a gente abraça.
Si ni um os fios perpassam espremidos,
ni outro os fios se tramam aconchegantes.
Si ni um se faz pensando no inimigo,
ni outro se faz pensando no filho.
Seguiria sendo fio, aquele fio
que precisou de um começo para existir
mas não sabia seu fim.
Seguiria sendo assim... começo...
meio... sem fim...

A Dona da Casa- Ana Paula Lisboa

Tive cinco, cinco filhos com meu marido, que era pra ajudar na roça, mas veio tudo mulher. A roça sustentava a casa e meu marido era o dono da roça.
Eu e as menina passava, lavava e tecia, que ensinei tudo a tecer que nem a mãe me ensinou. E eu era a dona da casa.
Aí um dia, o que era dono de mim e dono da roça, Deus levou. Minha mais velha ficou como dona da casa e eu virei a dona da roça.
Aí um dia eu chorei, chorei que molhei a roça toda, ficou tudo quase lama. Mas não parei de trabalhar mesmo chorando, que choro não faz brotar nada, só o trabalho é que faz.
Aí um dia eu ajoelhei, ali mesmo. E com o joelho na terra pedi a Deus que me desse um modo certo de sustentar eu e as menina, mas sem aquele sol na molera e a saudade do dono do meu coração.
Aí eu adormeci e sonhei que tava tecendo, eu e as menina. Era uma colcha, mas não aquela que a mãe me ensinou e eu ensinei pras menina. Era uma nova, que os desenho do pano nascia junto com o pano.
No sonho eu via os ponto de longe, depois via os ponto de perto, depois eu fazia o ponto e eu era o ponto tudo junto. Aí eu olhava pro lado e via minhas menina fazendo ponto e elas era ponto junto comigo; aí eu olhava pro outro e via as vizinha fazendo ponto e elas era ponto junto comigo.
Aí eu olhei denovo e tava pronto. Era colcha, e era colcha que tinha um jardim verde, verde. Tu não via um pedacinho de terra de tanta árvore, de tanta fruta, de tanta plantação. E a gente ficava tudo em volta olhando, olhando e não cansava o olho de olhar nosso trabalho.
Aí eu acordei e só queria tecer, mas tava escuro ainda. Fiquei na porta esperando o sol e quando vi uma pontinha dele corri pro tear.
Não fui pra roça, não. As plantas não ia morrer num dia, mas eu ia morrer se não tecê. Tinha hora que eu fechava o olho assim, e lembrava, e tecia mais ainda. Nem lembro se eu comi, se eu bebi nesse dia, só sei que eu teci.
Aí eu ensinei pras menina, ensinei pras vizinha e todo mundo pegou rápido, parecia até que elas tinha sonhado junto comigo.
Mas não esqueci de agradecer a Deus, porque depois de aí, eu Antonia, voltei a ser a dona da casa.

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