segunda-feira, 21 de junho de 2010

Desabafo - APL

E eu aqui, nua, na chuva, escrevendo em prosa.
Eu só estou cansada. Que droga!
Escrever essas coisas me deixa ainda mais irritada, com mais ódio.
Estou cansada de ouvir essa voz chata, irritante, gritante,
Que só fala do que não sabe.
Eu quero uma morte rápida, indolor, que ninguém se importasse,
Num caixão de madeira vagabunda, numa cova rasa, sem flores
E velas.
Minto.
Quero um velório de três dias, com fila na porta.
Quero rios de lagrimas derramadas, e quando a água secar,
Todos verão o sal na calçada.
Quero coroas de flores, quero milhares de velas e
Quero poesias declamadas nas portas.
Eu poderia escrever sobre assuntos relevantes:
Flores, crianças brincando,
Domingos ensolarados, noites estreladas,
Sobre o amor encontrado, o amor impossível,
Sobre a vida na França, um passeio de barco.
Mas não:
Falo de agonia, de dor, de morte matada,
De morte morrida, de choro velado e sobre pneumonia.
Eu não deveria ter me alfabetizado.
Mas vou parar de te incomodar.
Mesmo que doa, mesmo que eu me desmanche,
Mesmo que nada dê certo
E ainda que eu não tenha nem onde dormir.
Ou paro ou morro de vez.
Arranco fora as duas mãos e a língua
E os olhos e as orelhas e os pés.
Faço uma sopa com tudo e vendo na esquina,
Talvez alguém queira me comer.
Talvez.
Talvez eu sirva para alguém.
Talvez.
Talvez eu queira dar para alguém que pague.
Eu posso?
Os meus pés deviam correr,
Mas ficam aqui me olhando com cara de bobo,
Esperando sei lá o quê.
Eu não tenho nada aqui.
Nem pai, nem mãe, nem amigo, nem marido.
Eu me divorciei de todo mundo.

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